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Dom Walmor Oliveira de Azevedo

A vida só é vida se for vivida com nobreza. Nobreza que revela sua compreensão no mais exato sentido. Ora, a vida é dom e não simplesmente um tempo com suas circunstâncias ou uma oportunidade para desfrutar benesses e conveniências que satisfaçam, embora de maneira efêmera, o desejo de felicidade radicado no coração humano. A realidade da vida guarda uma complexidade que exige redobrada atenção e uma inteligente capacidade de sistematizar informações. De produzir uma lucidez indispensável e tornar cada indivíduo capaz de viver a vida com nobreza. Não se trata apenas de apossar-se de muitas informações como a cultura, neste tempo cibernético da atualidade, proporciona.

O conhecimento é determinante na conquista da capacidade de viver a vida com nobreza, isto é, vivê-la como dom. Para alcançar esta sabedoria é fundamental compreender que ela é dom de Deus. Há de se aceitar a referência ao Criador. Não se pode correr o risco de banir a dimensão da transcendência, própria do existir humano, o que se faz, muitas vezes, por inexata e estreita compreensão da laicidade, ou até mesmo por interesses. E, também, pelos resultados que a questão de Deus põe, hoje, à realidade existencial humana. A perda da referência última e fundamental compromete o sentido fecundo de viver, ou apenas permite viver a vida ancorada em muitos equívocos comprometedores dos rumos da própria vida e dos dias da sociedade contemporânea. É fundamental investir na análise da realidade para identificar e enfrentar, com novas propostas, tais equívocos, que comprometem perspectivas importantes da sociedade e da política; bem como abrir caminhos para avanços culturais significativos, alavancando mudanças individuais, hábitos sociais e políticos. É preciso superar desvarios como a corrupção e outros elementos deletérios, que impedem a sociedade brasileira de alcançar patamares de desenvolvimentos igualitários com mais rapidez, numa visão mais global das necessidades da população, particularmente dos mais pobres.

Uma consideração simples desta questão faz contemplar um cenário de absurdos que atrasam o aproveitamento da sociedade, no que diz respeito à oportunidade de superar a miséria que, de forma desumana, deixa grande parte da população sem saída. É necessário elencar, discutir e propor soluções, amplas e pontuais, globais e locais, com atuação determinante e audaciosa, em diferentes níveis; para que a justiça e a paz sejam itens permanentes da pauta de noticiários. E também dos empenhos de governantes na tarefa primeira de atender as necessidades do povo que representam. Não menos significativa é a responsabilidade individual de cada cidadão e sua articulação em rede social e política, na comunidade. Neste âmbito está uma alavanca determinante de mudanças, considerando-se a responsabilidade de cada um no exercício de suas funções, na garantia de compromissos e na sustentação de perspectivas que não causem prejuízos irreversíveis. E outros prejuízos, como se pode constatar nos comprometimentos da vida e nas opções de instâncias governamentais, e outras da sociedade, apontando na direção de derrotas que abrem buracos enormes e comprometem, no presente, o futuro de todos.

Há um entendimento desafiador da cultura na atualidade como exigência para a busca de respostas e configurações novas para esta mesma cultura que sustenta as direções e as metas do viver. Oscila-se de um extremo ao outro quando se dá grande importância – como se fosse uma necessidade – aos faustos tradicionais. Dizendo pouco para a vida contemporânea nas cortes e nos palacetes dos que têm dinheiro para esbanjar, até a lentidão inaceitável, quando se trata de encontrar soluções. Por exemplo, no que diz respeito à infraestrutura defasada em muitos âmbitos da sociedade brasileira. É um absurdo, entre outros, saber de estatísticas e vidas ceifadas nas estradas e comparar este desafio com a lentidão de encaminhamentos. E também com o envolvimento mais decisivo de autoridades e órgãos responsáveis, presos em burocracias e sem competência para respostas mais rápidas, como comprovadamente conseguem alhures. Não basta, portanto, estar na vez de uma economia emergente ou deleitando-se com o que parece confortável. É urgente retomar e partir, sempre, de raízes e princípios que cultivem o viver a vida com nobreza.

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte – MG

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