A comemoração do dia 8 de março projeta maior luminosidade na rica compreensão da dignidade e importância da mulher. Uma clareza que deve impulsionar modificações substanciais e mais rápidas no atual cenário, marcado pelos sucessivos casos de violência contra a mulher, particularmente no âmbito familiar. Uma situação inaceitável que precisa dar lugar à crescente participação das mulheres nos processos políticos, sociais, culturais, religiosos e familiares.
Na compreensão ajustada do significado da mulher no conjunto de processos da vida repousa uma força dinâmica com propriedades para mudar instituições e promover avanços significativos. É verdade que desde a Revolução Francesa várias conquistas foram alcançadas no que se refere ao reconhecimento da mulher, configurando, consequentemente, ganhos muito importantes para a vida e história da humanidade. Contudo, em razão de cristalizações nas culturas, fruto de compreensões não adequadas, atrasos ainda impedem uma participação mais efetiva. Assim, permanece o grande desafio de se conquistar um entendimento capaz de gerar novas posturas.
Nessa busca, uma rica referência é a Carta Apostólica sobre a Dignidade da Mulher, do bem-aventurado João Paulo II, publicada em 15 de agosto de 1988. É bem atual a referência à Mensagem Final do Concílio Vaticano II profetizando um tempo novo que ainda não acabou de chegar: “a hora vem, a hora chegou, em que a vocação da mulher se realiza em plenitude, a hora em que a mulher adquire no mundo uma influência, um alcance, um poder jamais alcançados até agora. Por isso, no momento em que a humanidade conhece mudança tão profunda, as mulheres iluminadas do Evangelho tanto podem ajudar para que a humanidade não decaia”.
No Sínodo dos Bispos de 1987, que refletiu a vocação e missão dos leigos na Igreja e no mundo, sublinhou-se a importância de se aprofundar sobre os fundamentos antropológicos e teológicos para ajudar na compreensão justa do significado da dignidade humana. Particularmente no que se refere à mulher, uma questão central que desafia a humanidade: a sua presença participativa na Igreja e na sociedade.
Os avanços são grandes. No entanto, ainda não são suficientes Quando se pensa teologicamente, sabe-se que a mulher está no coração do evento salvífico professado pela Igreja. A iluminação deste argumento está condensada na figura da mulher mais admirável: Maria, a Mãe de Jesus, o Redentor e Salvador. Conhecer a participação de Maria na história da humanidade, obediente e aberta amorosamente a Deus, é estar em contato com significativas lições, que iluminam a dignidade de todas as mulheres. Na condição comum de criatura humana, elas guardam também uma sacralidade advinda da filiação a Deus, sua imagem e semelhança.
É fascinante aquilo que é próprio da mulher, que constitui o seu ser. Trata-se de um grande dom. Pela condição própria dessa dádiva, muitos são os caminhos percorridos, os enfrentamentos exitosos no combate ao mal e na luta pela justiça, desde o contexto da narrativa bíblica, estendendo-se nas histórias e testemunhos de ontem e da contemporaneidade. Essa sacralidade na figura da mulher é uma inesgotável fonte de ética e de moralidade que não deixa perder a força dos valores, das referências e das tradições que configuram o tecido cultural necessário para garantir uma sociedade mais sã.
Voltando à Carta Apostólica referida, a grandeza da dignidade da mulher está em conexão profunda com a ordem do amor. O bem-aventurado João Paulo II lembra que no fundamento do desígnio eterno de Deus, a mulher, na sua feminilidade, é um profetismo com força educativa permanente. Obviamente que esta condição singular confere às mulheres uma especial missão. E para que possam exercê-la, precisam ganhar mais espaços, em todos os lugares e de variados modos. As mulheres merecem, de todos nós, uma especial reverência.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte