A construção cidadã da sociedade civil não pode prescindir da movimentação e dinâmicas próprias dos pactos e mobilizações que emergem fora das instâncias governamentais. Essa necessidade é vital para oxigenar os tecidos tendenciosos da burocratização, do partidarismo e, particularmente, em razão da perda inevitável do genuíno sentido social que mantém acesa a percepção das demandas do povo, especialmente das urgências dos pobres. O papel e responsabilidades governamentais cotidianas precisam contracenar permanentemente com a compreensão e movimentações próprias dos cenários da vida civil comum, sob a pena de perder a competência de fazer o que é prioritário. Sobretudo, fazer com alma e não, simplesmente, pelo dever de realizar tarefas. Quando este processo interativo fica comprometido é perceptível, pelo distanciamento da realidade, a dificuldade no cumprimento de promessas, na verdade obrigações; o discurso usado já não atinge os destinatários e a interlocução fica comprometida.
As mobilizações, dos mais variados perfis, são determinantes para que se conheça o sentimento da sociedade, especialmente, quando ficam esclerosados os canais de sua expressão popular. Obviamente, a geral condenação de atos violentos e do vandalismo é regra inegociável, até porque obscurecem a percepção da realidade que toda mobilização pode provocar no conjunto da sociedade ou em parte dela.
Neste sentido, falar de manifestações pacíficas jamais significa ofuscar suas repercussões, até mesmo em âmbito internacional. O entendimento de pacífico é o lado cidadão contrário ao vandalismo, à expressão de ódios e frutos de possíveis manipulações interesseiras e pagas. A força da mobilização se expressa pela repercussão na consciência cidadã. Na formatação da exigência de novas posturas e atendimento de demandas, fazendo chegar aos gestores públicos e privados a cobrança de respostas urgentes para as questões que afligem a população. Vence, assim, os atrasos criados por conta de disputas partidárias, incompetências administrativas e de pessoal ou por falta de lucidez na escolha das prioridades.
A sociedade civil precisa de mobilizações de variados tipos para garantir uma ordem social e política que não se torne refém de partidos ou de vaidades, com consequentes comprometimentos e atrasos como este que ainda pesa, lamentavelmente, sobre os ombros dos cidadãos brasileiros. Um peso que também se explica pelo modo como se faz política, priorizando interesses cartoriais e partidários em instâncias como o Congresso Nacional. Lugar onde, por excelência, devem ecoar, diariamente, os anseios e necessidades do povo. Neste âmbito, é fundamental avançar, esclarecer e buscar lucidez para não dar passos equivocados e comprometedores do bem conquistado na legislação e na busca para a efetivação da reforma política.
A reforma política é canal importante para repercutir em novas configurações o que melhor pode atender à edificação da sociedade civil, com parâmetros morais e éticos adequados e ao atendimento mais dinâmico de suas necessidades e direitos. E este é um momento oportuno para grandes e pequenas mobilizações, por ser ano eleitoral e pela realização da Copa do Mundo. Esses eventos de grande porte, e outros tantos, incidem sobre o sentimento popular. Assim, é preciso investir adequada e pacificamente para que o sentimento do povo ganhe força em todas as instâncias e segmentos da sociedade, para provocar a compreensão de suas demandas e gerar a consciência ético-social na edificação de uma sociedade solidária.
Os pactos sociais constituem outro vetor importante na construção da cidadania e na recomposição do tecido esgarçado da sociedade brasileira contemporânea. O florescimento desses pactos deve envolver as várias instituições e ter papel incidente e provocador de mudanças nos cenários que espelham a morosidade de instâncias governamentais. Têm que estar presentes nas realidades carentes do compromisso cidadão por parte das instituições privadas que ocupam papel de relevância na sociedade.
A celebração e efetivação dos pactos sociais também têm força para a permanente oxigenação de setores determinantes, como o da educação. Importante e urgente é, por exemplo, o pacto para a erradicação do analfabetismo.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte