As dinâmicas que configuram a interioridade de cada pessoa, fundamentais para a vivência transformadora da fé, dependem de dois âmbitos muito especiais: a família e a escola, determinantes para a formação humana. Por isso mesmo, uma sociedade que busca novas configurações e funcionamentos institucionais deve investir fortemente na família e na escola.
Esse investimento deve considerar uma definição de escola que não se restrinja ao ensino formal, o que significa contemplar as escolas formais e as muitas outras “escolas da vida”, lugares onde as pessoas também desenvolvem modos de ser e de agir. É preciso ainda conceituar família de um modo mais amplo. Obviamente preservar a família dentro do sentido incontestável do matrimônio, mas também considerar grupos sociais que se formam a partir de propósitos comuns – desde os que torcem apaixonadamente por um time de futebol aos que se reúnem em torno de projetos sociais e culturais, por exemplo.
A família e a escola, pensadas no seu sentido genuíno e essencial, mas também de forma mais abrangente, merecem atenção especial. Somente assim podem ser alicerçadas as urgentes mudanças na sociedade brasileira, fazendo surgir uma nova cultura, de vida e da paz. Essa cultura pressupõe o irrestrito respeito ao bem comum e à justiça. Por isso mesmo, depende de transformações no interior de cada pessoa que refletirão em suas escolhas. E nessas mudanças, é preciso que o amor seja vetor de desenvolvimento. Cultivam-se, assim, sentimentos humanitários e espirituais, que comprometem consciências e corações com o respeito ao outro, que é irmão.
Por tudo isso, reconhecendo a importância de transformações nos funcionamentos governamentais e de diferentes segmentos da sociedade, é fundamental reconhecer esta urgência: dedicar atenção especial à família e à escola. Vale, então, considerar analiticamente o que está acontecendo no contexto atual da sociedade contemporânea - atos de violência como o de um jovem que atirou contra colegas em uma escola, ou o desatino de atear fogo em si e nos outros, suicidamente. E ainda o domínio ilegal de territórios e seus habitantes motivado por propósitos que dizimam vidas. Tão destrutivamente forte quanto esses males todos são as práticas de corrupção, em pequena e larga escala.
A vitória sobre o que ameaça a vida só será possível se as famílias e as escolas forem cuidadas, urgentemente, de um modo melhor. Pois nas famílias e nas escolas é que podem ser barradas as delinquências que geram graves danos à cultura e a diferentes áreas, prejudicando a humanidade inclusive no desenvolvimento econômico. O caminho, assim, é investir para que se aprenda, na família e na escola, o exercício da solidariedade e da bondade.
A família e a escola despertam sentimentos que permitem a compreensão humanística sobre o que é viver. Edificam, com envergadura, o caráter de cada pessoa, que fica livre, inclusive, de graves quadros patológicos, a exemplo da perda do apreço pela própria vida, do hábito de se guardar e alimentar rancores, ressentimentos, ciúmes e disputas. Sem o adequado investimento na família e na escola, a sociedade permanecerá a conviver com o medo e a desconfiança, e ainda com o egoísmo que se manifesta na defesa mesquinha dos próprios interesses, sempre em prejuízo do bem de comum.
Há muito que modificar, quando se consideram os hábitos e práticas aprendidos e cultivados na família e na escola. É preciso coragem, humildade, disponibilidade para ouvir, seriedade e dedicação, na tarefa de compreender melhor e reconfigurar as práticas cotidianas. Diferentes complexidades surgem como desafios para o mundo atual, a exemplo do uso das novas tecnologias, que em algumas situações compromete laços familiares, a harmonia entre as pessoas. Não menos desafiador é o contexto urbano, tão ferido com a falta de civilidade e respeito. Essas realidades e tantas outras que precisam ser mudadas requerem dinâmicas com força para conduzir a sociedade no caminho do bem e da verdade, e os passos para trilhar esse trajeto são aprendidos na família e na escola.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
Ilustração: Jornal Estado de Minas