Além de tratar da preparação da visita ad Limina – a visita quinquenal que cada bispo, sucessor dos apóstolos, faz a Pedro, o Santo Padre, seu sucessor, aquele que preside o Colégio Episcopal -, a Assembleia de Pastoral avaliou e enriqueceu os três eixos pastorais que, prioritariamente, fecundam a identidade missionária das dioceses que congregam o povo de Deus no tecido da cultura mineira e capixaba.
A iluminação do conjunto da assembleia pastoral, que pensou, dentre outros assuntos, as juventudes, a comunicação, o cuidado com a vida, a formação e a vida dos sacerdotes, veio do âmbito desafiador que se refere à leitura da realidade. Uma leitura feita por meio de indicadores postos por olhares advindos da sociologia, filosofia, antropologia, psicologia e aspectos teológico-pastorais, e que é um lugar indispensável de interpretação em vista da configuração, definição e apropriação de meios na difícil tarefa de entender a malha da realidade na qual a Igreja está inserida.
A missão da Igreja depende também da lucidez de sua capacidade de interpretação. Porém, esta demanda não diz respeito tão somente à Igreja: a leitura da realidade é, na verdade, uma necessidade de instituições, grupos, movimentos e de cada pessoa. Uma leitura distorcida é risco e prejuízo certos quanto à clareza de rumos e, particularmente, na solução de problemas e encontro de respostas. Não é fácil esta tarefa. Isto porque a realidade é complexa e múltipla, não permitindo a pretensão de dominá-la e de, facilmente, explicá-la. A leitura da realidade é, pois, uma necessidade e um enorme desafio. Torna-se por vezes um enigma indecifrável – uma verdadeira característica deste tempo pós-moderno.
Não basta um elemento, uma coisa ou um lugar para se ter a garantia de uma leitura que, mesmo sem a pretensão de possuir ou de alcançar a verdade plena, possibilite modificar os territórios dos enganos e das interpretações que não alinhavam o atendimento da necessidade básica de produzir sentido. Percebe-se difusamente e vive-se na sociedade contemporânea uma nova necessidade de sentido. Esta demanda põe grandes exigências à aventura humana de viver e de participar da construção de uma sociedade mais justa e mais solidária. Multiplica-se a necessidade de elaborar uma adequada lucidez que não virá simplesmente da abordagem nascida da razão.
A razão não dá conta, por si só, de produzir sentido e de elaborar uma compreensão que articule o conjunto das significações para possibilitar a clareza de rumos, a pertinência da participação e o comprometimento no lugar que se ocupa. Também não dá conta de fazer brotar a consciência de sentido no próprio viver, e fazer de si a fonte da serenidade que não se pode deixar de ter, ou da capacidade de lidar com o diferente, o múltiplo e o rápido, características desafiadoras deste terceiro milênio.
Torna-se claro, sempre mais, que o não-conhecimento de Deus, em Cristo e com Cristo, faz da realidade um enigma cada vez mais indecifrável, em razão de o indivíduo não hospedar em si uma luz própria, sua espiritualidade e sua integridade moral. O indivíduo carente deste conhecimento, ainda que explique muito, toque aspectos interessantes e verdadeiros, próprios da realidade, será um kamikaze de si mesmo. Viverá a ilusão de que a felicidade está lá, no outro, do outro lado, nalguma coisa, incapacitado de perceber que, antes de tudo, a sua condição é determinante neste processo e condiciona nele a própria participação.
A humanidade está de passagem para um novo momento da história. Esta travessia não é fácil. É preciso conseguir passar da tristeza para a alegria, do absurdo para o sentido profundo da existência, do desalento para a esperança que não engana. Esta é uma experiência de encontro pessoal com Cristo. Sem Ele, a realidade será sempre um enigma indecifrável.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte