Este ano eleitoral é razão para uma convocação geral. É o momento de assumir a cidadania e enfrentar o desafio na busca de saídas urgentes para problemas sérios. Soluções que não podem se restringir à apresentação do nome de pessoas e nem mesmo em propostas partidárias, muitas vezes bem elaboradas no papel e sem força de efetivação.
É incontestável a necessidade de mudanças mais profundas na organização do Estado e nos seus funcionamentos para não continuar protelando respostas e demorando demais na tarefa de encontrar saídas para problemas graves e de prioridades regionais e nacionais.
A campanha eleitoral precisa sair do discurso, que tende à demagogia e é ancorado no que foi feito. E das promessas, instrumento tão comum no gênero literário eleitoreiro para convencimento dos que exercem a prerrogativa do voto. Obviamente os candidatos às eleições de 2010 hão de passar pela lupa do Ficha Limpa. Essa é uma conquista que está abrindo, passo a passo, um novo horizonte para a sociedade brasileira, prometendo uma nova e urgente cultura política.
Todos sabem o quanto a verdade tem sido camuflada pelas propagandas e pela força da mídia. Nos bastidores das atuações e definições de prioridades há atrasos e desconsideração das urgências dos pobres, além de outros fatores que são gerados pela desonestidade, pela burocracia irracional que atrasa respostas e também pela ausência de urgência na busca de saídas. Essa é uma faceta grave e desafiadora da crise de civilização que está em curso e que precisa ser analisada e enfrentada no bojo da sociedade brasileira. Não se pode navegar tranquilamente movidos apenas pelos ventos propícios do crescimento econômico.
Essa crise urge um entendimento do processo eleitoral como oportunidade para uma reforma do Estado, que vá além do ato de sufragar nomes apresentados por partidos. Ou como simples realização do desejo em ocupar um lugar sem ter a clareza e a competência técnica e moral, exigidos pela democracia representativa vigente na sociedade brasileira.
A pauta de discussões há de incluir análises pertinentes da realidade brasileira a partir da crise sistêmica que atinge o mundo inteiro. Não é hora de assentar os entendimentos nos costumes tradicionais do caciquismo político envelhecido, tônica ainda tão comum na política brasileira. Particularmente, as necessidades dos pobres não podem ser tomadas como mecanismo para impor uma direção personalista e perpetuadora de procedimentos que possam assegurar vitórias, sejam de pessoas ou partidos, mas que não tragam as garantias do “novo” esperado no rumo de uma reforma do Estado, objetivando funcionamentos mais adequados - resposta eficaz a essa crise que está ameaçando sempre os mais fracos e desprotegidos.
Não basta analisar e compor um diagnóstico da crise atual. É necessária a tomada de decisão política sobre os meios mais adequados e eficientes para a superação das dificuldades do dia a dia. Esse processo só avança se contar com pessoas competentes - técnica e moralmente - e com uma corajosa reestruturação das instituições, desde as prefeituras locais alcançando até as Organização das Nações Unidas (ONU). O Documento 91, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, indica que, “para enfrentar o desafio da crise sistêmica não bastam meias-medidas. Impõe-se a reforma estrutural das instâncias de poder, e isso não se faz de uma hora para outra: há um longo e difícil caminho pela frente. Justamente por ser longo, é preciso que os primeiros passos sejam dados desde já e na direção certa, fazendo-se reformas possíveis, mas com os olhos no horizonte utópica da democracia planetária. É hora, portanto, de união entre todas as pessoas que continuam a crer no triunfo da vida sobre a morte, porque assim será possível superar a crise e construir uma sociedade mundial justa e pacífica em harmonia com a grande comunidade da vida”.
Esse percurso inclui prioritariamente o debate sobre a reforma do Estado. Existe uma grande dificuldade para se deslanchar esse processo por causa da insatisfação e descrença no atual sistema político e nas instituições públicas consideradas apenas como espaços de corporativismo em favor dos poderosos, carentes de credibilidade. A credibilidade de pessoas e de instituições públicas é uma saída prioritária e permanente.
É longo o caminho para que se possa desvencilhar dos mecanismos envelhecidos de burocratização que impedem respostas rápidas como o momento atual pede. O processo eleitoral tem agora o desafio de ser um grande processo educativo e de efetivação de procedimentos para encontrar saídas.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte