A Igreja Católica participa das alegrias e esperanças, das angústias e das tristezas da humanidade. É solidária com todo homem e toda mulher, de todo lugar e de todo tempo. Trata-se de um dever assumido e proclamado na constituição pastoral Gaudium et Spes, fruto do Concílio Vaticano II (1962-1965). Emoldura esse horizonte de compromisso e fé, a passagem evangélica narrada por Mateus, no conhecido capítulo 25. Jesus fala do julgamento das nações, chamando-as a uma visão que considere o seu presente e seu futuro. Serão chamados benditos do Pai e convidados a receber a herança do Reino, preparado desde a criação do mundo, aqueles cuja conduta foi pautada no compromisso de fazer o bem e lutar pela justiça, em favor dos que são pobres, pequeninos e fracos.
Jesus apresenta neste ensinamento a regra de ouro que, se for assumida, muda muito, muda tudo: “Todas as vezes que fizestes isso a um destes mais pequeninos, que são meus irmãos, foi a mim que o fizestes”. Mas o que deve ser feito? Cristo nos responde: “Estava com fome e me destes de comer; com sede e me destes de beber; nu e me vestistes; doente e cuidastes de mim; na prisão e fostes me visitar.” A Igreja é, conforme apresenta sua Doutrina Social, “na humanidade e no mundo, o sacramento do amor de Deus e, por isso mesmo, da esperança maior, que ativa e sustenta todo autêntico projeto de libertação e promoção humana. Ela é ministra da salvação, não em abstrato, ou em sentido meramente espiritual, mas no contexto da história e do mundo em que o homem vive, onde o alcança o amor de Deus”. Neste horizonte compreende-se e se fundamenta o compromisso social da fé.
Buscando ampliar sempre essa dimensão social e cidadã do compromisso da fé cristã autêntica, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) promoverá, em setembro de 2013, sua 5ª Semana Social Brasileira, precedida de atividades e eventos significativos em todas as dioceses e paróquias. Os bispos do Conselho Episcopal Regional de Minas Gerais e Espírito Santo, nesta semana, reunidos em Assembleia Pastoral, incluíram na pauta de suas reflexões esta questão de grande relevância. Olhando a realidade social e política, a Igreja reaviva a consciência de seu compromisso de anunciar o Evangelho na rede de relações sociais.
Estabelece, assim, como meta importante nesse horizonte evangelizador o crescimento e o fortalecimento do tecido indispensável da solidariedade, princípio social insubstituível no ordenamento das instituições e das próprias relações sociais. Não se avança nessa direção apenas pelos mecanismos reguladores, que objetivam garantir a racionalidade dos processos. A vivência solidária se alcança pelo cultivo da fraternidade. É a partir deste caminho que se transforma culturas e instituições, segundo parâmetros que estão para além dos interesses do mercado e da economia. É oportuno lembrar o que diz o Papa Bento XVI, na sua Carta Encíclica sobre o desenvolvimento humano integral na verdade e na caridade, Caritas in Veritate. O Papa sublinha que “sem formas internas de solidariedade e de confiança recíproca, o mercado não pode cumprir a própria função econômica”. Precede tudo isso, o cultivo da vida como dom.
A direção indicada pelo Papa mostra que o desenvolvimento econômico, social e político, para ser autenticamente humano, precisa dar espaço ao princípio da gratuidade, gerador da vivência solidária. A lógica fria dos números, a mesquinhez da ganância do lucro irracional e perverso impede que o crescimento econômico mude, verdadeiramente, o cenário aviltante de pobreza e miséria. Quando o IBGE, em divulgação recente, aponta que 58% dos brasileiros têm carências sociais não se pode simplesmente permanecer na inércia requerendo ações e intervenções efetivas de governos. A pauta diária de todos deve incluir a preocupação com a qualidade de vida de cada um, respondendo as urgências dos mais pobres. Isso requer mudança de mentalidade e lucidez de ações. Ainda é preocupante a realidade de atraso educacional, qualidade dos domicílios, acesso aos serviços básicos e à seguridade social. Só uma apurada sensibilidade acolherá a inquietação, por exemplo, da triste realidade de cinco milhões de crianças expostas a doenças por falta de saneamento básico. Que os clamores da realidade e a fé iluminem uma nova mentalidade, criando condições para mudanças mais rápidas.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte