Artigo de dom walmor

Conquistar a paz é hoje, neste Dia Mundial da Paz, uma convocação e um compromisso a ser assumido por todos. Caminho imprescindível para constituir forte corrente capaz de promover significativas mudanças na sociedade. Para que transformações ocorram é preciso que cada pessoa faça do próprio coração lugar da paz. Trata-se de enorme desafio, diante dos desagastes que o dia a dia impõe à dimensão existencial, as velocidades e exigências que apressam tudo e causam incômoda aridez, as incompreensões e embates que são fruto da falta de uma visão mais abrangente da realidade, o descompromisso com aqueles que precisam de ajuda. Diante desse cenário, é possível constatar que a conquista da paz é um programa de vida.

 

 

O Papa Francisco, na mensagem enviada ao mundo inteiro para este Dia Mundial da Paz, faz uma preciosa indicação: vencer a indiferença para alcançar um mundo mais pacífico. A indiferença é o grande mal, aponta o Papa, na contramão de tudo o que pode promover a paz. Sua raiz, recorda Francisco, está na indiferença em relação a Deus. Suas consequências são nefastas: apatia, reações pífias à injustiça e ao desequilíbrio social, disputas e conflitos, fontes de insegurança e violência. A indiferença é silenciosa, mas perigosa, um verdadeiro “barril de pólvoras” nas relações sociais. Importa, ao se desejar e buscar a paz, um sério investimento na superação da indiferença que anestesia progressivamente os corações, deixa fora de cena o comprometimento social e humanitário.

 

Um coração insensível inviabiliza o necessário empenho para se alcançar o bem comum. E para vencer a indiferença, há um itinerário infalível que requer permanente aprendizagem: o exercício da misericórdia. Para além dos planos escritos e das estratégias elaboradas em diferentes âmbitos, prioritário é investir na conversão do próprio coração. Cada um, à luz de princípios morais e valores éticos, pode alcançar qualificações que irão sustentar condutas, escolhas, os rumos da própria vida. Nessa tarefa, a experiência autêntica da fé garante uma fecundidade inigualável. Basta reconhecer que Deus não é indiferente. Para Deus, o importante é a humanidade – Deus não a abandona, como bem diz o Papa Francisco em sua mensagem. Essa compreensão e o comprometimento em não abandonar a humanidade são imprescindíveis para que brote no coração humano um elevado sentido de cidadania e de respeito a cada pessoa.

 

Assim, o programa de vida que precisa ser adotado por todos inclui assumir propósitos, desdobrados em ações e atitudes, que sejam marcadas pelo amor, compaixão, misericórdia e solidariedade. Decisivamente, a solidariedade é a grande força na busca da paz. Não se avançará suficientemente enquanto a solidariedade não for uma prioridade no coração de cada pessoa. Os processos políticos, culturais e humanitários, por mais lúcidos que sejam, sofrerão revezes terríveis e baixas altamente prejudiciais pela falta de amor ao próximo. Torna-se, assim, inadiável o investimento na cultura da solidariedade e da misericórdia. Trata-se de mecanismo eficaz para vencer a indiferença. A solidariedade é uma virtude moral e um comportamento social com incalculável força transformadora. Por isso mesmo, é urgente que todos se tornem agentes engajados na aprendizagem e na vivência da solidariedade.

 

A conquista da paz se faz pela contrarreação que, urgentemente, precisa surgir para debelar a globalização da indiferença. O Papa Francisco pede que todos se inspirem nas diversas experiências louváveis que mostram o poder da solidariedade: organizações não governamentais, grupos caritativos, que nascem dentro e fora da Igreja, associações que socorrem vítimas de catástrofes humanas e ambientais. O Papa cita ainda o trabalho imprescindível de jornalistas e fotógrafos ao informar a opinião pública, interpelando consciências, assim como o papel de famílias que investem na educação dos seus filhos ensinando-lhes a agir na contracorrente da indiferença, pela aprendizagem da solidariedade.

 

A urgente qualificação do jeito de ser de cada pessoa para mudar os rumos da sociedade e torná-la mais justa, condição primordial para a paz, tem como prioridade buscar formas para vencer a insensibilidade dos corações. Em vez de lamentações ou de apontar o que os outros devem fazer, precisamos nos engajar no grande mutirão que busca vencer a indiferença e conquistar a paz.

 

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte

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