A Semana Santa não é, evidentemente, uma semana de mais dias do que as demais do ano. Porém, os dias que, pela Graça de Deus, podemos e devemos vivenciar nessa semana são profundamente significativos para revermos nossa vida de uma maneira geral. Essa revisão se faz muito pertinente e necessária à medida em que vamos percebendo cada vez mais uma perda de sentido da vida.
Qual é o verdadeiro sentido que devemos atribuir à vida? A Semana Santa nos dá uma resposta que permanentemente nos desafia, porque nos provoca e até pode nos incomodar profundamente, quanto mais nos deparamos com a realidade de que o mais poderoso do mundo foi o seu maior servidor.
Não é possível aceitar essa lógica como cabível ou compreensível sem se deixar incisivamente questionar. Na maneira mais comum de pensar, não seria nem um pouco difícil concluir que a palavra “unção” poderia facilmente estar associada a uma situação que teria muito a ver com um engrandecimento ou uma exaltação à pessoa, para um status de maior relevância na sociedade.
Olhando para a vida do próprio Jesus, pelas suas palavras e, mais ainda, pelos gestos, não poderemos dar outra resposta que não seja esta: servir |
No entanto, em nosso caso, a unção só tem sentido quando a pessoa está autenticamente consciente de que se trata de uma consagração, ou seja, permitir que o sagrado fundamentalmente envolva toda a vida da pessoa, não para que esta tenha maior visibilidade ou destaque, e sim, em vista d’Aquele que foi o perfeito ungido e servidor do Pai, na força do Espírito, para autenticar toda consagração, principalmente já no próprio batismo.
Todos fomos ungidos, já desde o batismo para, e acima de tudo, mostrar que “essa história de servir” não saiu da moda para aqueles que creem e veem que não é possível ser um bom cristão ou uma boa cristã, sem escutar o que Jesus nos diz em Jo 15, 16: “Não fostes vós que me escolhestes, mas fui que vos escolhi e vos destinei para irdes e produzirdes fruto…”
Não há dúvida de que precisamos escolher Jesus, o caminho de seu seguimento, como discípulos e discípulas dele, para fazermos valer o seu nome que usamos, quando nos dizemos cristão ou cristã. No entanto, escolher Jesus significa, simplesmente, deixar-se escolher por ele, ou seja, reconhecer que a iniciativa é dele. É Ele que vai à frente e nos chama, chama você, chama a mim para irmos e produzirmos fruto. Ora, não podemos produzir frutos agradáveis ao paladar do Senhor, se não tomamos consciência de que essa escolha e destinação é para uma vida de disponibilidade, gratuidade, generosidade, proximidade com o irmão, a irmã, criança, adolescente, jovem, adulto, pessoa idosa, enferma, excluída desta sociedade que marginaliza e joga de lado, ou seja, põe de escanteio, sendo que ela mesma foi quem favoreceu que tal pessoa chegasse nessa situação desumana.
“Não fostes vós que me escolhestes, mas fui eu que vos escolhi e vos destinei para irdes e produzirdes fruto…” Em toda escolha existe uma preferência. Somos os preferidos do Senhor! Poderíamos até questionar essa preferência, se pensarmos que somos apenas uma entre inúmeras pessoas. Sabemos, porém, que Deus, na sua infinita sabedoria, nos conhece e nos ama, pessoalmente, como ninguém! Não estamos nesta vida, neste mundo, para sermos somente mais um ser humano. Também não tem sentido entendermos essa escolha de um jeito que nos demos o direito de nos sentir superiores aos demais ou a tantas outras pessoas, como se nossa dignidade humana valesse mais que a do próximo. É justamente para trabalhar contra esta mentalidade corrente que fomos escolhidos pelo Mestre!
A escolha de que fala Jesus, dirigindo-se aos seus discípulos e a nós, deve fazer-nos lembrar de que nossa concepção já foi uma escolha de Deus Pai e, depois, isto foi confirmado no batismo e na crisma, quando sabemos que fomos ungidos! Para quê foi esta unção? Qual o motivo desta escolha? Quais são os frutos que o Senhor espera de nós?
Olhando para a vida do próprio Jesus, pelas suas palavras e, mais ainda, pelos gestos, não poderemos dar outra resposta que não seja esta: servir! Toda a vida dele foi pautada por este objetivo! Quando disse aos discípulos: “quem quiser tornar-se grande entre vocês, seja servo dos outros; e todo aquele que quiser ser o primeiro entre vocês, seja o escravo de todos”, ele mesmo, com suas atitudes, deixou bem esclarecida esta verdade!
Pensemos, então, aproveitando a oportunidade que esta grande semana do ano nos oferece: acreditamos nesta verdade?
Dom Luiz Gonzaga Fechio
Bispo auxiliar da Arquidiocese de BH