Valorizar a vida por meio do resgate da integridade ética e moral das pessoas que procuram o apoio do grupo Alcoólicos Anônimos(AA). É o que pretende mostrar a Paróquia São João Batista, em Santa Luzia (MG), ao realizar a “Semana Social”, evento que conta ampla participação da comunidade.
O princípio básico da transformação do dependente, acredita-se, é conhecer-se para respeitar os próprios limites e, assim, passo a passo alcançar a desejada mudança de vida. Vale como inspiração o filósofo Sócrates: “Conhece-te a ti mesmo, torna-te consciente de tua ignorância e serás sábio”.
Isso porque, a atração pelo vício parece ser uma busca da satisfação de um sentimento perdido, talvez de carinho ou compreensão, arrancado pelo caminho. Um desejo de resgatar algo que falta para alcançar a plenitude. Afinal, é inconcebível a ideia de que uma pessoa possa levantar-se um dia, disposta a destruir a própria saúde e a moral, pelo abuso descontrolado da bebida.
Todo ser humano tem em si uma pulsão de vida que o chama ao cuidado e à atenção consigo próprio. A psicanálise explica bem, através de Freud, essa energia vital que há no homem, assim como o seu oposto, que é a pulsão de morte. Para sermos presença construtiva na vida das pessoas é preciso ter boa vontade para compreendê-las. Rotular é a pior opção. Se julgamos um beberrão simplesmente como alcoólatra e nos dermos por satisfeitos quanto a essa definição, jamais o conheceremos na sua essência, tampouco, teremos a chance de saber o real motivo que o levou a esse descontrole.
São inúmeras as causas que conduzem ao vício, entre elas, a violência na infância, o abandono, a falta de amor, e que deixam sequelas por toda a vida. Comprometem relacionamentos futuros e transferem os mesmos problemas para as gerações seguintes, por meio de atitudes que comprometem o convívio familiar e social.
Buscar ajuda especializada é o modo mais indicado para se romper com esse círculo vicioso .Quem busca o apoio de grupos como o AA é um vencedor, pois escolheu o caminho certo para lutar contra a natureza vazia de sentido e a entorpecência sem sentido. O silêncio e a omissão são artimanhas do vício para sufocar o grito de socorro que a pessoa emite em sinais e gestos, que nem sempre são entendidos pelos demais.
Toda transformação deve ser gradual e consentida, para ser consistente. Um processo que não tem lugar para a ilusão, a fantasia |
Nos grupos como o AA, o anonimato e o sigilo dão coragem e segurança à pessoa para mergulhar num processo de auto conhecimento e, ao mesmo tempo, abrir o coração aos demais. Quanto mais se fala, mais se conhece e se respeita as próprias limitações. Aumenta, assim, a possibilidade de compreender de onde vem o vazio que empurra para a dependência e ganha-se convicção para se manter sóbrio.
Esse movimento que salva vidas é mundialmente conhecido e não tem vínculo religioso nem político, mas tem no Poder Superior, como chamam a Deus, sua relação de cura. Todos ali sabem que sem o auxílio do alto, nada são e nada podem. Aprendem que na vida, todas as decisões e mudanças devem ser tomadas, comedidamente, vivendo um dia de cada vez, pois o caminho se faz a cada passo e não na ilusão de mudar da noite para o dia como que por um passo de mágica. Toda transformação deve ser gradual e consentida, para ser consistente. Um processo que não tem lugar para a ilusão, a fantasia. Como eles dizem no AA: ‘Hoje não! Agora não!’. Eles têm a clareza de que só podem responder pelo agora, pelo hoje, e que sobre o amanhã, só Deus tem ciência.
Até chegar nessa noção, estes filhos amados de Deus enfrentam a difícil tarefa de reconhecerem-se doentes e carentes de ajuda, que deveria vir da própria família. Contudo, os familiares são os primeiros a serem fragilizados pelo convívio com o dependente. O Alcóolicos Anônimos torna-se, então, um programa para a família. Mas a vontade própria do dependente é o impulso inicial de toda essa proposta de transformação. Deus, ou o Poder Superior, sempre oferece outra chance e encoraja à mudança quando se está no caminho errado. Mas, também, respeita o tempo de cada um e o livre arbítrio. Cada pessoa ter claro para si que é responsável pelas próprias titudes e pelas consequências que elas provocam.
É indispensável fazer a leitura da realidade para, assim, entender que as atitudes, muitas vezes, são respostas e reflexos dos estímulos propostos ao indivíduo pelo ambiente onde está inserido. E, na atualidade, a carga cultural advém dos valores de uma sociedade consumista e capitalista. Ninguém fica imune aos convites subliminares das campanhas veiculadas pelos meios de comunicação e nas redes sociais. Em algum momento se é levado, mesmo que involuntariamente, a fazer algo sob as sutis influências da mídia, o que, no entanto, não nos exime da responsabilidade pelas nossas escolhas.
Não se trata, contudo, de cultivar sentimos de culpa. Ao contrário, o perdão é fundamental, aliado à consciência de que errar, cair e se reerguer é um processo no qual a recaída não deve ser vista como derrota, mas algo que fortalece o compromisso com a própria reconstrução. Nesse processo, só não vale desistir. É preciso ter coragem para ir em frente com propósito de mudança, certo de que Deus está ao lado daquele busca e de que muitos irmãos, no mundo inteiro, estão rezando, intercedendo pela sua recuperação e tantos outros que vivem essa mesma situação.
Tenha a certeza de que você é o único responsável pela sua felicidade e administração da sua vida, por ajudar tantos outros a serem mais felizes, com seu testemunho diário, mostrando que essa transformação é possível.
Deus os abençoe. E contem, sempre, com minhas preces e orações.
Pe. Gustavo Tadeu
Administrador paroquial da Paróquia São Paulo Apóstolo