“Em cada nova etapa da história, a Igreja, impulsionada pelo desejo de evangelizar, não tem senão uma preocupação: quem enviar para anunciar o mistério de Jesus? Em que linguagem anunciar esse mistério? Como conseguir que ressoe e chegue a todos os que devem escutar?”
PAULO VI. Evangelii Nuntiandi, 22.
Com essa frase inicia-se o trabalho de apresentação do tema “Querígma e a transmissão da fé no contexto atual”, por dom Leomar Antônio Brustolin, na 4ª Semana Brasileira de Catequese.
Depois da participação das conferências anteriores que nos possibilitou experienciar o saber do ser discípulo aquele que ouve o chamado de Jesus, o reconhece como mestre, e se une a Ele numa resposta ativa; que no processo evangelizador da catequese de Iniciação à Vida Cristã, a formação do discipulado não é apenas uma etapa, mas um fio condutor que trespassa todo o projeto de Iniciação, tendo como desafio o modo de apresentar Jesus; que a Palavra de Deus é o caminho que leva a descobrir a centralidade da Páscoa, expressão máxima da misericórdia de Deus, tomamos assim consciência de que devemos testemunhar o Evangelho levando ao mundo a universalidade da proposta de Jesus, na tentativa de superar todo tipo de dicotomia entre fé e vida; entre ser e fazer.
Dom Leomar, ao iniciar sua conferência, reafirma a importância do saber fazer na catequese, considerando que, muitas vezes, o catequista ainda se preocupa mais em organizar, fazer, planejar mais do que viver realmente a Palavra. Pergunta: Onde foi parar em nossa querigma o crucificado? Onde foi parar a cruz? A fé crista não aceita fanatismo, nem fundamentalismo. Ser cristão exige seguimento de Jesus Cristo. Citando o Instrumentum Laboris do Sínodo de 2012, afirma que “muitas comunidades cristãs ainda não perceberam plenamente o alcance do desafio e a natureza da crise gerada por este ambiente cultural também no interior da Igreja”.
Ao apresentar uma análise da atual realidade, ele nos chama a atenção para o fato de estarmos vivendo no mundo de intensa pluralidade cultural e religiosa, crise de alteridade, cultos sem ética, e cita o livro do professor alemão Gyung-Chul Han intitulado “A Sociedade do cansaço” e assim nos provoca para que possamos destinar um olhar atento, um olhar de discipulado para a realidade presente, onde se constata acontecimentos que se sucedem, e não poucas vezes, que os cristãos vivem maior preocupação com as consequências sociais, culturais e políticas da fé do que com a própria fé, considerando esta como um pressuposto óbvio da sua vida diária.
Percorrendo o olhar pela resenha do livro “A Sociedade do Cansaço”, apresentada por um pesquisador da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, o Sr. Diego Silva da cunha, ele apresenta a seguinte análise do livro: “o Autor Han critica as implicações das transformações culturais e comunicacionais do nosso tempo, nomeadamente as novas configurações do trabalho, da atenção e da doença mental. A hipercomunicação, tratada pelo autor, enquanto modalidade da violência da sociedade positiva (por oposição à sociedade negativa) está ligada a vários excessos, particularmente a uma sobrecarga da produtividade e dos estímulos midiáticos. A experiência hodierna decorre num espaço percorrido por egos transbordantes, num espaço da permissividade do idêntico, a figura antagônica da alteridade. Esta é uma análise que comporta uma visão crítica das sociabilidades do século XXI, permitindo pensar as consequências culturais, existenciais e sociais da hiperatividade e hipermobilidade atuais”.
Assim demonstrada a realidade atual na qual encontramos, e diante da diversidade religiosa, como evangelizar?
Dom Leomar oferece algumas dicas. Diz: o cristianismo não está acabando. A cultura dual não transmite mais a fé, mas a liberdade religiosa. Os cristãos de amanhã sentirão a fé como um elemento especial da graça que favorece seu desenvolvimento humano. Viverão a fé em meio a pessoas que vivem de modo diferente deles; anunciarão mais pelo testemunho do que pelas palavras. O encontro com Cristo se dará através de relações de proximidade, encontro e diálogo.
Uma chance para dar maior qualidade de seguimento são os encontros, não de massas, mas de pequenos grupos. Não se anuncia uma mensagem fria ou apenas um corpo doutrinal. Para anunciar é preciso afirmar, gritar, comunicar; é transmitir a fé com toda a vida. O anúncio da fé é sempre uma atitude comunitária. O encontro pessoal não se separa do encontro com aqueles que percorrem o mesmo caminho. Há uma relação entre o eu e o tu, entre a pessoa e Deus; que se relaciona com o nós. A fé exige que o eu se encontre no nós.
Para propor o querígma, este deve de ser de forma continuada e permanente. É o primeiro em sentido qualitativo, porque é o anúncio principal, aquele que sempre se tem de voltar a ouvir de diferentes maneiras e aquele que sempre se tem de voltar a anunciar (…) em todas as suas etapas e momentos (EG, n. 163). Assim, toda a Iniciação à Vida Cristã se renova, renovando sempre a comunidade.
Coloca-nos os desafios a serem enfrentados: passar de uma religião de herança social para uma religião de opção pessoal; de uma sociedade unificada pela fé católica para uma sociedade constituída na liberdade democrática e no pluralismo de ideologias. De uma igreja de massa a uma igreja diferenciada e articulada em pequenas comunidades de discípulos missionários. E nos afirma: “em meio ao pluralismo e relativismo do nosso tempo, é improvável que tenha bom efeito um anúncio imposto e fechado, sem diálogo”.
O Diálogo inter-religioso pode tornar uma sociedade plural numa vivencia democrática quando atende suas próprias exigências de convivência dialogal entre as diversas visões de mundo, deixando-se pautar pela justiça, paz, defesa do meio ambiente e a construção da tolerância, pois diante do cenário brasileiro marcado por um florescimento religioso, há ama busca maior da religião como opção, e não mais por tradição.
Neuza Silveira de Souza
Secretariado Arquidiocesano Bíblico-Catequético de Belo Horizonte