Nesta edição, aprofundaremos a reflexão sobre a importância da Palavra de Deus em nossa vida e em nossa catequese, como primeira fonte. É fundamental considerarmos que esta Palavra foi escrita há muito tempo e por isso precisa sempre ser atualizada e interpretada.
O contexto atual se encontra marcado pelo pluralismo e pelo subjetivismo, numa cultura onde se constata o rompimento das novas gerações com as instituições. Os costumes e o modo de viver tradicional têm provocado a perda de conexão com os antepassados, e por desconhecimentos, perda dos valores da cultura tradicional, até mesmo dos valores religiosos. Temos um grande desafio que é o de compreender e dialogar com as novas gerações que, inseridas em novas culturas, nos impõe a busca de uma nova linguagem para o despertar da sensibilidade para a beleza do “mistério simbólico” presente na vida de fé.
Desde o princípio da criação do mundo, o ser humano vem desenvolvendo seus conhecimentos a partir das experiências vividas e partilhadas, no decorrer da história. É assim que o povo de Deus foi aprendendo com a vida a grande sabedoria de Deus, e guardando-a como um tesouro, no qual se condensam as ligações que só a vida pode ensinar.
Os Padres da Igreja, nos primeiros séculos da nossa história de fé, souberam captar das experiências escritas dos nossos antepassados uma grande sabedoria. Das experiências escrita vamos partilhar um pouco sobre os escritos do livro “Cântico dos Cânticos”, um livro que descreve as experiências de um povo que fez a experiência de ter perdido tudo, passado pelo Exílio da Babilônia e agora vão recomeçar um novo jeito de viver a vida ao retornar para casa.
O Cântico dos Cânticos e suas interpretações
Esse livro é um poema de amor, profundamente humano e intensamente apaixonado, entre dois jovens. Ele celebra o amor mútuo de um Amado e de uma Amada, que se unem e que se perdem, se buscam e se encontram. O amado é chamado de “rei” (1,4. 12) e “Salomão” (3,7.9); a amada é designada a “Sulamita” (7.1), nome que tem sido relacionado com o de Salomão ou com o da Sulamita que aparece na história de Davi e de Salomão (1Rs 1,3; 2,21-22)
Este livro fala de Deus uma única vez para dizer que a paixão é como “uma faísca de Javé” (Ct 8,6), e emprega a linguagem de um amor apaixonado, o que tem causado estranheza. Ao falar do amor, ele descreve a história de amor entre um homem e uma mulher e a apresenta como modelo para o amor humano. De todas as experiências humanas, o amor é a que mais nos aproxima do divino.
Das várias maneias que se pode interpretar a Bíblia, o gênero literário da “alegoria” é o mais antigo. Os autores bíblicos se utilizam dela, no livro do “Cântico” para falar do amor de Deus por Israel e o amor do povo por seu Deus, representados como o relacionamento entre dois esposos.
Os autores cristãos seguiram a mesma linha que a exegese judaica, mas nos seus escritos a alegoria transformou-se na das núpcias de Cristo com a Igreja ou da união mística da alma com Deus. Muitos comentadores católicos modernos permaneceram fieis a essa interpretação alegórica. No próximo encontro daremos continuidade a esta reflexão.
Neuza Silveira der Souza
Coordenadora da Comissão Bíblico-Catequética da Arquidiocese de BH