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Neste mundo, somos peregrinos

“É melhor buscar refúgio no Senhor do que pôr no ser humano a esperança” (Sl 117,8)

 

Jesus nos ensinou a arte de viver: sabia se relacionar com as pessoas, fazendo conta delas, amando e deixando-se amar, mas sua vida inteira apontava para sua confiança irrestrita no Pai. É tão bonito descobrirmos a beleza de cada irmão, contarmos com eles, sentir que caminhamos juntos, que podemos nos apoiar uns nos outros… É tão belo o dom de nossa família, o amor recebido e ofertado em seu seio e a riqueza da convivência! Mas por mais belas que sejam nossas convivências, por mais caras e cheias de alegria e amor, nelas não podemos colocar nossa esperança, pois seria sempre um risco. Colocar nossas esperanças em pessoas e realidades humanas é estar vulnerável e construir nossa casa sobre a areia.

Nossa natureza facilmente se encanta com as realidades passageiras. Elas são mesmo belas, pois nos foram dadas pelo Criador que é trasbordante em beleza. Esse encanto não é mal por si mesmo. Mas quando nos apegamos a eles corremos o perigo de colocar nossa esperança em certos bens afetivos, certas circunstâncias ou certas pessoas como se pudessem nos salvar de nossos sofrimentos pessoais, de nossas inconstâncias, de nossos vazios e ausência de respostas.  As criaturas são para nós inúmeras vezes instrumentos do amor bondoso de Deus, mas são sempre instrumentos e nunca fonte.

 

Sendo ainda pouco “familiarizados com o sofrimento”, não costumamos ter muita alegria quando nos sobrevêm aflições e contrariedades, mas concordamos que momentos assim nos fazem refletir que vivemos em um exílio e que nesta vida tudo é transitório. Não há realidade neste mundo que seja permanente e estável o suficiente para que nelas possamos nos apoiar. Estamos a caminho. Quando estamos viajando por um trajeto longo, normalmente precisamos contar com alguma pousada pela estrada. Paramos em um restaurante, um hotel, na casa de um conhecido, em uma lanchonete, em um lugar onde se possa usar o banheiro… Mas nenhum destes locais é nosso destino, temos a ajuda destes serviços necessários para dar suporte para nossa viagem, mas eles servem apenas de suporte, sabemos que é preciso continuar, seguir viagem para encontrar o destino. Nossa estrada não é sempre plana e o tempo não é sempre bom.

 

Enquanto estamos a caminho, devemos ter todo o cuidado, pois só estaremos seguros ao chegar ao desejado destino

Toda viagem está sujeita a riscos e desafios. Ora o clima é ameno e agradável, ora o calor é insuportável; ora a brisa é suave e a paisagem é encantadora, ora a chuva é violenta e a neblina não nos permite ter a visão necessária para seguir em frente; se por vezes o pavimento é novo e espaçoso, por outras vezes é cheio de buracos, estreito e sem acostamento; muitos são os bons companheiros de viagem que seguem o mesmo rumo com prudência e mansidão, mas outros tantos são os imprudentes e deles precisamos nos defender com atenção e previsão. Enquanto estamos a caminho, devemos ter todo o cuidado, pois só estaremos seguros ao chegar ao desejado destino. As tempestades e demais contratempos do caminho nos fazem desejar chegar logo. Elas nos fazem perceber toda a insegurança do trajeto e nos fazem sonhar com o seguro repouso que só teremos ao chegar.

Em nossa peregrinação sobre esta terra, as contrariedades nos fazem “cair na real”, nos recordam que estamos “em viagem”. Quando nos distraímos,

nos fazem recobrar a memória e tomar consciência da nossa condição de peregrinos. Que Jesus nos dê hoje a graça de bendizer as contrariedades pelo bem que elas nos trazem! Costumamos agradecer sem esforço pelas consolações que recebemos, mas seremos injustos se não reconhecermos tudo o que as aflições e contrariedades fazem por nós! Em um sincero esforço de fé, vamos começar agora?

 

Bendita sejas, caríssima adversidade, por seres tão útil!
Tens em ti verdadeira lealdade e me fazes despertar para a realidade!
Bendita sejas, estimada contradição, por me recordares quem sou e para onde estou caminhando!
E mesmo contigo me angustiando, sei que o Senhor se aproveita de ti e através de ti está me amando!
Bendita sejas, aflição, tu que fazes tremer meu coração!
Ao ver-me desejar pôr a esperança neste chão,
Acordas-me desta cruel ilusão!

 

Agora é com você! Com ou sem rima, se lance nesta experiência! Se encontrar a utilidade das adversidades é imitar Cristo, precisamos aproveitar a graça deste tempo fecundo de ressurreição para crescer na direção da estatura do Mestre e nos abrir à compreensão de que não devemos pôr nossa esperança em coisa alguma do mundo, pois recordando Santa Teresa de Ávila, “Tudo passa, só Deus não muda”.

 Que Deus nos dê a graça neste dia de não nos distrairmos com as consolações que a vida nos dá. E que saibamos dar graças por todas as contrariedades que nos fazem desejar com mais vigor a segurança verdadeira que só poderemos encontrar nos braços de Deus. 

 

Ludmila Rocha Dorella
Consagrada da Comunidade de Vida

 



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