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Lectio Divina – escutar a voz de Deus

O importante é adquirir a prática de ouvir a Deus. Ouvir não com o ouvido, mas com o coração. Ouvir a Deus     é  acolher  no  coração o que Ele inspira

‘Lectio Divina’ significa leitura divina das Sagradas Escrituras ou, como nós a conhecemos atualmente, “Leitura Orante”.  A ‘Lectio Divina’ é uma prática antiga dentro das comunidades cristãs, com diferentes maneiras de realizá-la. Ela recebe este nome de Orígenes, que viveu do ano 185 a 253 do nosso tempo. No Brasil foi sistematizada pelos monges cartuchos, por volta dos anos 1200. Com o movimento da Contra-Reforma, por volta de 1530, esta prática esfriou-se em meio às comunidades cristãs, mas retomou o seu impulso com o Concílio Vaticano II.

Orígenes desenvolveu três modalidades importantes de leitura da Bíblia. Primeiramente ele leu a Bíblia com a intenção de analisar melhor o texto e de oferecer a edição mais confiável. Então, o primeiro passo: conhecer realmente o que está escrito e conhecer o que essa Escritura pretendia dizer. Em segundo lugar, Orígenes leu sistematicamente a Bíblia com seus comentários. Ele procurava captar bem o que queriam dizer os autores sagrados. E em terceiro lugar ele dedicou-se à pregação. Em suas Homilias ele aproveitava para lembrar as diversas dimensões do sentido da Sagrada Escritura, que ajudavam a exprimir um caminho no crescimento da fé: há o sentido literal; um sentido ‘moral’, ou seja, o que devemos fazer vivendo a Palavra; e a dimensão ‘Espiritual’, isto é, a unidade da Escritura, que em todo o seu desenvolvimento fala de Cristo.

 

A Leitura Orante sempre teve como objetivo favorecer o encontro pessoal com Deus, por meio da Palavra. Aos poucos ela vai se tornando uma prática frequente  entre nós cristãos que desejamos dar testemunho da Palavra de Deus. Quando realizada com frequência, ela modifica para  melhor as nossas relações conosco mesmos, com os outros, com o universo, e com Deus que vem ao nosso encontro para dialogar conosco, para escutar-nos. É o encontro entre dois corações, entre dois desejos; é doação recíproca. Deus vem ao nosso encontro e nos chama à comunhão, por meio de uma escuta obediente e disponível: “Fazei tudo o que Ele vos disser” (Jo 2,5). Nós vamos ao seu encontro com o desejo ardente de encontrar com Ele, aquele que o nosso coração ama, e de realizarmos a sua vontade com a comunidade que nele acredita.

O importante é adquirir a prática de ouvir a Deus. Ouvir não com o ouvido, mas com o coração. Ouvir a Deus é acolher no coração o que Ele inspira. A resposta do Senhor é semeada no nosso coração, no mais íntimo do nosso ser, no mais profundo de nós mesmos, no cerne de nós mesmos, lá onde Deus habita, lá onde Deus mora.

Pode-se fazer a Leitura Orante de várias formas. Aqui vamos apresentar a forma de leitura Orante orientada pelo SAB – Serviço de Animação Bíblica.  Trata-se de uma proposta de cinco passos na sequencia: Leitura, Meditação, Contemplação, Oração e Ação. Ela segue uma estrutura que se desenvolve basicamente em três momentos:

Introdução

Inicia-se com um momento de silêncio, introduz o texto bíblico que será rezado propondo esse encontro pessoal com Deus. Se está em grupo, ou comunidade, dá-se as boas vindas, canta-se um ‘mantra’, prepara o coração para o encontro com Deus.

Um segundo momento é a contextualização do texto e sua estrutura. Que texto vamos rezar? onde ele se encontra na Bíblia? em que contexto está sendo narrado? Por exemplo, se o texto escolhido é do Evangelho de Marcos 4,1-9.13-20 sobre a parábola do Semeador e sua explicação, podemos situá-lo no conjunto do Evangelho de Marcos: esta parábola faz parte dos ensinamentos de Jesus, dados ao povo e aos discípulos, na região da Galiléia, ao norte da Terra de Israel. Jesus estando à beira do lago de Genesaré, entrou num barco, sentou-se e começou a contar a parábola do semeador e dar sua explicação. Comparou a semente com a Palavra e os diferentes tipos de terreno onde ela cai, com os diferentes tipos de ouvintes.

Passos da Leitura Orante

LEITURA

Através da leitura podemos observar a que gênero literário o texto pertence. No sentido histórico: qual a sua dimensão econômica, social, política, ideológica e afetiva; no sentido teológico podemos observar o que Deus tinha a dizer para aquele povo e para nós hoje. O texto deve ser lido e relido, em voz alta, com atenção. Deixar o texto falar para cada pessoa, pois cada uma vai ter a compreensão do texto de acordo com a sua vivência, sua experiência, sua realidade. Na Leitura respondemos à pergunta: o que o texto diz?

Se está em grupo pode cantar um ‘mantra’ ou um refrão de um canto, entre um passo e outro. No nosso exemplo pode-se pensar no refrão: Põe a semente na terra, não será em vão. Não te preocupe a colheita,plantas para o irmão.

SEGUNDO PASSO – MEDITAÇÃO

A Meditação nos ajuda a responder à pergunta: O que o texto diz para mim? para nós? O que o texto quer dizer? qual a mensagem que nos apresenta hoje? Como atualizamos a palavra em nossa vida?  Partindo de uma Palavra ou versículo do texto faz-se o diálogo com Deus, em que ele pode ajudar; que mudanças propõe? Aqui, eu, você, nós somos chamados ou chamadas a refletir sobre aquilo que mais chamou sua atenção e por quê. Que tipo de terreno eu sou? Como acolho a Palavra de Deus, que é semeada de mil formas no terreno do meu coração, em meu dia a dia?

TERCEIRO PASSO – CONTEMPLAÇÃO:

Contemplação é o reviver, com os personagens do texto, a experiência que eles viveram. No meu dia de hoje, o  que essa Palavra me leva a experimentar? procurar reconstruir na mente o cenário onde está sendo narrado o texto. Imagine Jesus chegando ao lago de Genesaré, ou a um lago que você conhece. Ele entra num dos barcos que estava ali, e senta-se no barco e começa a ensinar o povo e a seus discípulos, por meio da parábola do semeador. A semente da Palavra que Jesus foi anunciando, caiu no coração dos ouvintes. O coração que era como o terreno “ao longo do caminho”, o “terreno pedregoso”, o terreno “cheio de espinhos” e por fim, “numa terra boa.
Imagine-se no meio dessa multidão, entre esses ouvintes. Escolha o seu lugar. Observe a expressão da face de Jesus, o tom de sua voz, o seu jeito de olhar a multidão e os seus discípulos. Contemple Jesus e a multidão. Pouco a pouco perceba os desejos, sentimentos que vão nascendo em seu coração.

QUARTO PASSO – ORAÇÃO: A oração nasce da experiência vivida desde a leitura, a meditação, a contemplação. Ela me leva a responder à pergunta: O que o texto me leva a falar com Deus?  Este é o momento de falar com Deus sobre os desejos e sentimentos, que a Palavra fez nascer em seu coração. Pode ser uma oração de agradecimento, de louvor, de pedido e até mesmo de se fazer silêncio e escutar.

QUINTO PASSO – AÇÃO: É o momento de escolher um gesto concreto, para viver a Palavra. a pergunta que se faz é: O que o texto me sugere viver? Pode ser uma atenção maior aos que convivem comigo, paciência com as pessoas, uma palavra amiga a quem precisa, uma ajuda aos necessitados etc.

Oração conclusiva: Que o Senhor nos abençoe e nos guarde; conceda-nos a graça de sermos terra boa, que acolhe sua Palavra, procura traduzi-la em gestos de amor, de verdade, de justiça e de fraternidade.
Bendigamos ao Senhor. Graças a Deus.

Neuza Silveira de Souza

Coordenadora da Comissão Arquidiocesana Bíblico Catequética de Belo Horizonte.



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