Luciana da Silva Araújo – Historiadora/
Memorial da Arquidiocese de Belo Horizonte
João Resende Costa nasceu em 19 de outubro de 1910, em Borda da Mata, interior de Minas Gerais, filho de Francisco Marques da Costa Júnior e de Mariana Resende Costa. De seus pais e familiares recebeu os primeiros ensinamentos voltados para a religião. Iniciou seus estudos em sua cidade natal, aos 9 anos de idade mudou-se com sua família para o município de Cruzeiro, interior paulista.
Na adolescência ingressou no Colégio São Joaquim, na cidade de Lorena (SP), instituição fundada no século XIX e dirigida pela Congregação Salesiana, lá permaneceu por dois anos. Em seguida foi transferido para o Colégio São Miguel, em Lavrinhas (SP), outro educandário coordenado pelos filhos de Dom Bosco.
No início de 1927, João Resende Costa entrou no Noviciado dos Salesianos. Em 31 de Janeiro 1928 concluiu a sua primeira profissão religiosa. Nos anos seguintes cursou Filosofia e Pedagogia no Colégio São Miguel. Posteriormente, entre os anos 1930 a 1932 tornou-se professor (tirocínio) na cidade de Lavrinhas (SP).
Ainda nos anos 30 frequentou o curso de Teologia na Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma. No dia 28 de julho de 1935 foi consagrado padre na Igreja de Santo Inácio. Dois anos depois na mesma Universidade, concluiu o doutorado em Teologia Dogmática defendendo sua tese L´influsso di De Dominis nella dottrina de Martin de Barcos (A influência de De Dominis na Doutrina de Martin de Barcos).
Padre João retornou ao Brasil no final de 1937 e assumiu o cargo de diretor de estudos no Instituto Teológico Pio XI, de 1938 a 1940. Entre 1941 a 1943 dirigiu o Liceu Salesiano Colégio de Jesus (SP). Em 1944 foi promovido a diretor do Instituto Teológico Pio XI, permanecendo no cargo até o ano de 1948.
Em 12 de março de 1948, Pe. João Resende Costa foi empossado como Inspetor[1] Salesiano no Sul do Brasil (São Paulo, Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul). Inserido nesta função, ele tinha a incumbência de distribuir os clérigos pelos diversos órgãos sob responsabilidade da ordem, além de designar os padres para as paróquias dirigidas pelos Salesianos. O sacerdote exerceu está função até 1952.
Devido à sua trajetória como educador, o Padre João Resende Costa tornou-se integrante da Delegação Brasileira nos Congressos Interamericanos de Educação Católica. Participou de encontros em Bogotá (1945), Buenos Aires (1946), Rio de Janeiro (1951). No ano de 1953 em Havana, ocupou o cargo de Presidente da Delegação.
Em 1952, ao participar do XVII Capítulo Geral da Congregação Salesiana, em Turim (Itália), foi eleito membro do Conselho Superior da Congregação, na qualidade de Conselheiro Geral e Visitador Extraordinário. Devido a está atividade Padre João Resende Costa estabeleceu residência na cidade italiana. No início de 1953, em visita a região Norte do Brasil como Conselheiro Geral, o Padre recebeu a notícia que se tornaria Bispo de Ilhéus (BA).
No dia 24 de maio de 1953, recebeu a ordenação episcopal pelas mãos do Cardeal Arcebispo de São Paulo, Dom Carlos Carmelo de Vasconcellos Motta, como co-sagrantes dois bispos salesianos: Dom Antônio Campelo de Aragão e Dom Orlando Chaves. A cerimônia foi realizada na Matriz do Liceu Coração de Jesus (SP).
Em Ilhéus, Dom João Resende Costa foi o quinto governante do bispado. Ao longo do seu governo realizou inúmeras obras religiosas, promoveu o I Congresso Eucarístico Mariano (1954), organizou a Semana Paroquial do IV Centenário da criação da Paróquia de São Jorge dos Ilhéus (1956), ampliou o Seminário Diocesano. Também empenhou-se nas obras finais da Catedral de São Sebastião, pois o templo era visto pelos membros do clero e pela população católica como um importante palco para celebrações religiosas.
Após quatro anos à frente do bispado de Ilhéus (BA), no dia 19 de julho de 1957, Dom João foi nomeado pelo Sumo Pontífice como Arcebispo Coadjutor e Administrador Apostólico “Sede Plena” da Arquidiocese de Belo Horizonte. A transferência ocorreu devido à frágil condição de saúde na qual se encontrava o primeiro arcebispo, Dom Antônio dos Santos Cabral.
Dom João Resende Costa e a Arquidiocese de Belo Horizonte.
No dia 30 de novembro de 1957, em cerimônia realizada no Palácio Cristo Rei, Dom João Resende Costa tomou posse como arcebispo coadjutor da Arquidiocese de Belo Horizonte. O evento contou com a presença de Dom Geraldo Maria Penido (bispo auxiliar da Arquidiocese), Frei Martinho Penido Burnier, o Governador José Francisco Bias Fortes e sua esposa Dona Queridinha. Além destas personalidades, outras autoridades políticas e eclesiásticas participaram da solenidade.
Em 1967 tornou-se o segundo Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte, por ocasião do falecimento de Dom Antônio dos Santos Cabral. No dia 28 de abril de 1969, recebeu em Roma, por meio de um Procurador, o pálio arquiepiscopal. O sagrado pálio foi imposto nele pelo Cardeal Carlos Carmelo de Vasconcellos Motta, no dia 24 de maio de 1969, na Catedral da Boa Viagem.
Como arcebispo coadjutor, Dom João Resende Costa passou a gerir o bispado. Diante das várias responsabilidades atribuídas, o novo governante assumiu o propósito de conhecer mais a fundo a realidade da Arquidiocese. Com esse intuito visitou as paróquias, as comunidades religiosas masculinas e femininas, as organizações leigas (Apostolado da Oração, Filhas de Maria) e também realizou reuniões com o clero. Esteve presente em inúmeras celebrações populares. E criou 85 paróquias no decorrer de sua atividade pastoral.
Nos primeiros anos de sua gestão, o Arcebispo Coadjutor trilhou os caminhos jurídicos necessários para impulsionar a instalação da diocese de Divinópolis (MG), que foi instituída em 1958. Consagrou a Igreja de São Francisco de Assis, em 1959, hoje denominada Capela Curial São Francisco de Assis (construída em 1943). O reconhecimento da Igreja[2] se deu após longo período de debates entre o setor público e o eclesiástico. Com a aprovação, Dom João celebrou a primeira missa no espaço que contou com a participação dos fiéis e das autoridades.
Para além destas ações, no início da década de 1960 o arcebispo incentivou o “Movimento por um Mundo Melhor”[3] na Arquidiocese. Padre Alberto Antoniazzi menciona em seu texto Faces e fase da Igreja de Belo Horizonte dos anos 50 aos anos 70, que esta associação apresentou um papel importante na implantação do planejamento pastoral no país. Haja vista que o fomento deste movimento colaborou com o alinhamento do Plano de Emergência (1962) produzido pela CNBB na 5ª Assembleia Geral. O plano pastoral foi um pedido do Papa João XXIII aos episcopados da América Latina com o intuito de atender às condições da Igreja no continente.
Dom João Resende Costa participou das quatro sessões do Concílio Vaticano II[4] inaugurado pelo Papa João XXIII em 11 de novembro de 1962 e concluído pelo Papa Paulo VI no dia 7 de dezembro de 1965. Segundo os escritos biográficos do Arcebispo de Belo Horizonte, ele participou do evento como Padre Conciliar e integrante do Conselho Episcopal de Imprensa do Concílio.
Em 1964, ele assumiu a Secretaria Nacional do Apostolado dos Religiosos e foi secretário da Região Leste II da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) durante quatro anos. Esteve presente no 38º Congresso Eucarístico Internacional em Bombaim (Índia), em 1964. Quatro anos depois, na Colômbia, foi membro da 39º edição do Congresso Eucarístico Internacional sediado em Bogotá e integrou a II Conferência Geral do Episcopado Latino Americano, em Medelín. O último evento foi convocado pelo Papa Paulo VI com o propósito de aplicar os ensinamentos produzidos no Concílio Vaticano II às necessidades da Igreja instalada na América Latina. Nos anos 1970 coordenou a delegação mineira no XLI Congresso Eucarístico Internacional na Filadélfia (EUA). Em 1977 foi eleito delegado do Episcopado brasileiro para o Sínodo dos Bispos em Roma.
A gestão pastoral de Dom João Resende Costa coincidiu com o momento em que a Igreja do Brasil se preparava para a realização e aplicação das exortações estabelecidas no Concílio Vaticano II. E por este motivo a Arquidiocese de Belo Horizonte foi reestruturada à luz do Evangelho, buscando responder melhor às necessidades da sociedade moderna.
Sob a égide dos ensinamentos conciliares, o Arcebispo estimulou a renovação litúrgica nas paroquias. Promoveu o desenvolvimento do setor pastoral no bispado com a criação dos Conselhos Presbiteral (1967) e Pastoral (1971) e a Coordenação Pastoral. Renovou as diretrizes do Seminário Arquidiocesano com a nomeação de uma equipe de padres que foram designados para propor um novo regulamento para a instituição. Fundou o Centro de Pastoral Catequética e o Instituto Central de Filosofia e Teologia. No campo social, incentivou a instalação da Caritas e a Ação Social Arquidiocesana.
No campo da comunicação, houve a valorização dos diversos sistemas de transmissão disponíveis no período. Neste sentido, Dom João reiterou o grande valor da imprensa católica estabelecida na Arquidiocese servindo-se de programas semanais[5] e entrevistas nas emissoras de TV e Rádio para favorecer a interlocução entre Igreja e fiéis. Na década de 1970 foi adquirida a emissora Rádio América – AM 750, o que significou um marco na modernização dos meios de comunicação da Arquidiocese. O arcebispo e Dom Serafim Fernandes de Araújo (então bispo auxiliar) foram os responsáveis por moldar as diretrizes da emissora.
Além das inovações (preconizadas pelo Concílio Ecumênico) na Igreja de Belo Horizonte, a administração de Dom Resende Costa foi contemporânea de adversidades políticas e sociais impostas ao país pelo governo militar. Apesar do contexto social da época, o arcebispo impulsionou a criação e o fortalecimento das instituições vinculadas à Arquidiocese. Bons exemplos deste trabalho foram: a criação da Fundação Mariana Resende Costa (FUMARC), em 1978 pela Sociedade Mineira de Cultura (SMC); a construção do Edifício Pio XII, cujas atividades comerciais ali desenvolvidas renderiam recursos para a manutenção do Seminário. Após o reconhecimento jurídico da Universidade Católica de Minas Gerais em 1958 (da qual D. João era o Grão Chanceler), ele promoveu a expansão da instituição com a instalação dos cursos de ensino superior no antigo prédio do Seminário Arquidiocesano – localizado no bairro Coração Eucarístico.
No ano de 1980, o Papa João Paulo II veio ao Brasil pela primeira vez. A visita do Santo Padre aconteceu entre os meses de junho e julho daquele ano. A vinda do Sumo Pontífice à capital mineira foi alinhada com o arcebispo metropolitano, que orquestrou as ações necessárias. A ocasião mobilizou e comoveu grande parcela da população.
Dom João Resende Costa foi um exímio pastor que exerceu forte influência na Arquidiocese de Belo Horizonte. No campo da educação e da cultura sua atuação também é muito expressiva. Pouco antes do fim da sua gestão como arcebispo, ele traçou os meios para que a Universidade Católica de Minas Gerais fosse agraciada com o título de pontifícia. No ano de 1983 após todos os trâmites necessários para titulação a Sagrada Congregação para a Educação Católica, do Vaticano, concedeu a honraria à instituição. Após este feito, veio a receber o título de doutor honoris causa da PUC Minas concedido pela Universidade, honra atribuída àquele que contribuiu para a cultura, educação e humanidade.
Devido a estas e outras ações, o bispo foi eleito para a Academia Mineira de Letras, como o terceiro sucessor da cadeira 11, que tem como patrono o inconfidente Frei José de Santa Rita Durão (1722-1784) e fundador Carlos Góes (1881 – 1934). Do poder municipal recebeu o título de “Cidadão Honorário” (essa horaria é concedida pela Câmara de Vereadores a quem realiza trabalhos memoráveis na localidade).
Em 1985, Dom João Resende Costa completou 75 anos de idade e apresentou ao Santo Padre o seu pedido de renúncia, segundo as normas do direito canônico. No dia 05 de fevereiro de 1986, o Papa João Paulo II aceitou a sua renúncia ao cargo de arcebispo. A partir daí tornou-se arcebispo emérito – aquele que teve sua carta de renúncia aceita – da capital mineira. Ele foi sucedido por Dom Serafim Fernandes de Araújo (que era arcebispo coadjutor há alguns anos).
Sua trajetória como pastor da comunidade católica de Belo Horizonte foi muito relevante para a consolidação dos ensinamentos do Concílio Vaticano II na Arquidiocese. Grandes foram as suas realizações em prol da fé e do Evangelho. Dom João Resende Costa faleceu aos 97 anos, em julho de 2007, foi sepultado na cripta da então Catedral Nossa Senhora da Boa Viagem.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANTONIAZZI, Alberto. NEVES, Lucília de Almeida. PASSOS, Mauro (org.). As veredas de João na barca de Pedro. PUC Minas. Belo Horizonte, 2002.
ARQUIVO ARQUIDIOCESANO DE BELO HORIZONTE. Dom João Resende Costa. Fotografias. Caixa 09 – 14. Sala 13.
ARQUIVO ONLINE ARQUIDIOCESE DE BELO HORIZONTE. Governo. Dom João Resende Costa e Dom Antônio dos Santos Cabral. Disponível em: <http://arquivo.arquidiocesebh.org.br/site/arquidiocese.php?menu=Dom%20Jo%C3%A3o%20Resende%20Costa&id=148;http://arquivo.arquidiocesebh.org.br/site/arquidiocese.php?menu=Dom%20Ant%C3%B4nio%20dos%20Santos%20Cabral&id=147> . Acesso em 12 jan. 2021.
BOSCHI, Caio César. OSA, Luiz Antônio (Coord.). A Arquidiocese de Belo Horizonte e as instituições vinculadas. Belo Horizonte. Ed. PUC Minas, 2019.
BOSCHI, Caio César. OSA, Luiz Antônio (Coord.). A Arquidiocese de Belo Horizonte e a evangelização. Vol.2. Belo Horizonte. Ed. PUC Minas, 2014.
DICIONÁRIO HISTÓRICO-BIOGRÁFICO BRASILEIRO – DHBB: COSTA, JOÃO RESENDE. Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil, 1967– 1986. Disponível em: http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/costa-joao-resende. Acesso em: 12 jan. 2021.
FERRETTI, Carla. A Igreja Católica e a construção do espaço urbano em Belo Horizonte. Caderno de História. Belo Horizonte: PUC MINAS, v.6, n.7, p. 5-19, julho/2001.
MACEDO, Janete Ruiz de. Diocese de Ilhéus: 100 anos de história. Editus. Ilhéus, Bahia. 2013. Disponível em: <http://www.uesc.br/editora/livrosdigitais2015/diocese_ilheus.pdf> Acesso em: abril de 2021.
MELO, Antônio Alves de. O Vaticano II: origens, avanços, perspectivas. Interações: Cultura e Comunidade. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Uberlândia. Vol. 8. Nº 13. 2013. Disponível em: < https://www.redalyc.org/pdf/3130/313028475002.pdf> Acesso em 13 abr. 2021.
PASSOS, Mauro. Religião e Sociedade: O Movimento Religioso em Belo Horizonte na Década de 1970. Disponível em: <http://www2.dbd.puc-rio.br/pergamum/docdigital/simposioteologia/pdf/Mauro%20Passos.pdf> Acesso em 13 abr.2021.
SALESIANOS DON BOSCO CG28 Salesianos Don Bosco. Homepage. Disponível em: <https://www.sdb.org/pt> Acesso em 12 abr. 2021.
[1] Inspetor ou Superior Provincial é um cargo de nível hierárquico elevado na congregação, que age sob comando do Reitor-mor dos Salesianos. O Superior Provincial supervisiona e coordena as obras da congregação nas unidades administrativas (inspetorias) regionais.
[2] – Entre 1943 e 1959 houve grande evolução no entendimento sobre arte e arquitetura sacras em relação ao estilo moderno. Essa mudança foi depois confirmada no Concílio Vaticano II.
[3]-“O Movimento por um Mundo Melhor, criado na Itália e adaptado no Brasil pelo Pe. José Marins, foi um instrumento importante para a renovação pastoral. Através de cursos para o clero, os religiosos, as religiosas e agentes de pastoral, em várias regiões do Brasil, uma nova linha de trabalho foi sendo difundida. Essa atualização cuidava da formação das lideranças católicas, prescindindo das estruturas tradicionais e abrindo perspectivas para uma ação missionária. ” (PASSOS. p. 4. 2009)
[4]-Concílio Vaticano II foi anunciado pelo Papa João XXIII em 25 de janeiro 1959. Inaugurado em 11 de outubro 1962, organizado em quatro sessões. Encerrado em 08 de dezembro 1965. O Concílio foi um acontecimento que “representou a abertura para uma autocompreensão da Igreja diferente daquela então predominante e para outra compreensão da presença e missão da Igreja no mundo. ” (MELO, p 24, 2013)
[5]– Dom João Resende Costa apresentava um programa de conteúdo religioso na TV Itacolomi intitulado “Ave Maria”, e levado ao ar em 3 de maio de 1961.