Alegra-te, cheia de graça! O Senhor está contigo. (Lc 1, 28)
Os primeiros capítulos do Evangelho de Lucas são marcados pelo convite à alegria. Deus, na sua infinita misericórdia, nos deu o que havia de mais excelso: seu Filho Unigênito. Não é uma alegria qualquer ou um contentamento momentâneo. É a alegria da Salvação, de modo que nossa história nunca mais será a mesma: Deus se fez homem no seio de Maria.
A notícia de tão grande acontecimento é dada pelos “mensageiros” da corte celeste. Gabriel, o Embaixador do Altíssimo, se dirige a Zacarias e anuncia-lhe o nascimento de um filho que será motivo de alegria para ele e para muitos (cf. Lc 1, 14). O Arcanjo também se dirige a Maria, saudando-a com seu “Alegra-te, cheia de graça! O Senhor está contigo (cf. Lc 1, 28). Ela, compreendendo-se como “a serva do Senhor” (Lc 1, 38), acolhe a proposta divina de ser mãe do salvador, e essa alegria é partilhada com todos, sobretudo os pobres que aguardam seu libertador. Nesse sentido, também os pastores são visitados pelo anjo que anuncia a eles uma grande alegria, a qual se estende a todo o povo, pois nasceu o Salvador. Um evento tão grande, escondido em tamanha simplicidade, só poderia terminar com um grito de louvor ecoando por todo o céu: “Glória a Deus!” (Cf. Lc 9-14).
E no coração de toda essa alegria está um casal que acolhe com total generosidade o mistério divino concretizado, na Encarnação do Verbo de Deus. A alegria que os envolveu não foi algo que durou apenas os meses da gestação de Jesus, findando com a visita dos pastores. Ela se estende por toda a vida dessa família. Bem sabemos que Jesus, Maria e José não tiveram uma vida imersa num “mar de rosas”, com anjinhos tocando violino, mas viveram com luta, com coragem e com sofrimento. O mistério da encarnação, vida, paixão, morte e ressurreição do Senhor trouxe-lhes alegria e sofrimento, como no mistério da vida de toda a humanidade.
São Francisco de Assis ensinou-nos sua espiritualidade, profundamente marcada pela humanidade do Verbo de Deus. Presépio, Cruz e Pão e Vinho consagrados revelaram a Francisco, de forma condensada, que Deus, pela humanidade de Jesus, se fez pobre, se fez menor. E se Deus se fez menor, como pode o ser humano não tomar o mesmo caminho de minoridade? Por isso que Francisco, crendo na divindade de Jesus, contempla-lhe a humanidade, escolhendo o modo pobre em que viveu Jesus e sua mãe como o seu modo de também viver, e de toda a sua Ordem.
A Alegria de Maria é um dos aspectos do mistério da humanidade do Verbo, pois o que alegrou profundamente a Virgem está intimamente relacionado a Jesus. Por isso que a família franciscana elege esse aspecto da história da salvação, transformando-o no exercício de piedade mariana que ficou caracterizado como a devoção às Alegrias de Maria, ou a Coroa Franciscana.
A contemplação da Alegria de Maria, dividida em sete momentos de sua vida (por isso falamos de “Alegrias”) é uma antiga devoção dos franciscanos. Reza a lenda que, em 1422, um jovem muito piedoso ingressou na Ordem Seráfica e tinha como costume demonstrar seu amor à Virgem Maria depositando diante de sua imagem uma coroa de rosas. Sendo-lhe proibida essa prática, o jovem pensou em deixar a Ordem, mas teve uma visão de Maria, pedindo que não abandonasse a vida religiosa e que, no lugar de rosas, oferece a ela a contemplação das sete alegrias que viveu desde a anunciação até a assunção ao céu.
O mestre de noviços, que impusera a proibição, também teve uma visão: via que, à medida que o noviço rezava, um anjo ia tecendo uma coroa com sete dezenas de rosas intercaladas por um lírio dourado, que, ao final da oração, o anjo depositou sobre a cabeça do noviço. A partir desse sinal, nasce e lentamente vai se difundindo essa piedade mariana em toda a família franciscana.
Basicamente, reza-se a Coroa Franciscana contemplando uma Alegria de Maria, seguida de um Pai-Nosso e de dez Ave-Marias (comumente sem jaculatórias). Antes das sete dezenas, ou no final, acrescenta-se mais duas Ave-Marias. O objetivo é se chegar ao número de setenta e duas Ave-Marias, o que, supostamente, corresponderia a cada ano da vida de Maria.
As Sete Alegrias de Maria contempladas são:
Primeira Alegria: Anunciação do Anjo;
Segunda Alegria: Maria visita sua prima Isabel;
Terceira Alegria: Nascimento de Jesus em Belém;
Quarta Alegria: Adoração dos Magos;
Quinta Alegria: Maria e José encontram Jesus no templo;
Sexta Alegria: Maria vê Jesus ressuscitado;
Sétima Alegria: Assunção e coroação de Maria no céu.
Destacamos que essa devoção não é uma negação à devoção das Sete Dores de Maria. A Coroa Franciscana entrou para a história da Ordem em razão de seu caráter lendário quanto à identificação com a questão da “alegria”, tema importante na espiritualidade franciscana.
Enfim, convidamos todos à prática dessa singela devoção mariana. Uma preciosa opção para as comunidades eclesiais é o Ofício da Mãe do Senhor, organizado por Reginaldo Veloso e distribuído pela editora Paulus. Esse Ofício tem a mesma estrutura do Ofício Divino das Comunidades, mas dividido em Ofício das Alegrias, das Dores e das Glórias, e conta com um grande repertório de hinos, salmos e cantos, além de várias indicações bíblicas e as datas das principais celebrações marianas.
Frei Jonas Nogueira da Costa, ofm
guardião da Fraternidade Santa Maria dos Anjos (Betim),
professor no Instituto São Tomás de Aquino e
doutorando em Teologia Sistemárica (ênfase em Mariologia)
pela Faculdade Jesuíta de Teologia e Filosofia