Três pequenas capelas sinalizam um caminho antigo na Serra da Piedade, no município de Caeté, que começa no Recanto Monsenhor Domingos (antigo asilo São Luís) e segue até encontrar o Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade. Nesse ambiente, não é preciso muito esforço para se imaginar os fiéis subindo as encostas da Serra para chegar à Ermida dedicada à Virgem Maria, a 1746 metros de altitude. Há mais de 250 anos, nascia ali uma tradição de fé e devoção a Nossa Senhora da Piedade. As capelinhas fariam parte de um conjunto de 14 estações da Via-Sacra, um sonho do Monsenhor Domingos Evangelista Pinheiro, o fundador da Congregação das Irmãs Auxiliares de Nossa Senhora da Piedade. Gesto de fé e devoção a Nossa Senhora da Piedade, que hoje permite resgatar um período importante das antigas peregrinações.
Duas das três capelinhas construídas por Monsenhor Domingos foram restauradas
Duas capelas já foram restauradas e a terceira, próxima à entrada do Santuário, também será revitalizada e integrada ao circuito da Via do Peregrino – explica o reitor do Santuário, padre Wagner Calegário, ao ressaltar a importância de trazer para o presente a história dos peregrinos e a origem das peregrinações ao Santuário: o caminho original. “Será uma oportunidade pela qual as pessoas, por uma dinâmica nova, poderão contemplar e se abrir ao Mistério de Deus, que se expressa na criação, na exuberante beleza de tudo o que existe por aqui. É uma forma de proporcionar às pessoas, nesse itinerário, que é belo e marca uma face desconhecida do Santuário, essa experiência do Mistério do Deus que não só se faz pela beleza, mas nos chama a expressar essa mesma beleza”.
Economia sustentável e geração de renda
A via do peregrino, com suas capelas fazem parte de um plano integral de desenvolvimento do Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade que se iniciou em 2010, e favorecerá ainda mais toda a região, a partir de uma qualificada peregrinação e de um qualificado suporte que também trará renda, movimentando a economia da região. “O trabalho assumido pelo Santuário, como também pela Congregação das Irmãs Auxiliares de Nossa Senhora da Piedade, busca proporcionar um atrativo significativo para o desenvolvimento integral, respeitando o turismo e o ecossistema, por meio de uma economia responsável” – enfatiza o reitor.
Fiéis peregrinam em peregrinação ao Santuário Nossa Senhora da Piedade – foto do início do século 20
Padre Wagner Calegário recorda que há 10 anos, quando, por iniciativa do arcebispo dom Walmor, se buscou revitalizar e qualificar o Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade, dando a ele o seu caráter de referência e patrimônio dos mineiros, trabalha-se para resgatar a história e qualificar a experiência das peregrinações em todo o complexo do Monumento Estadual da Serra da Piedade, e dentro dele, no Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade.
A Via do Peregrino é uma das importantes iniciativas desse movimento de revitalização, e o reitor garante que permanece vivo o desejo de ter esse importante caminho religioso sendo utilizado por fiéis das diferentes regiões do país, a exemplo das muitas outras possibilidades que o Santuário Basílica de Nossa Senhora da Piedade oferece. “Queremos fazer das capelas um marco nesse itinerário que não precisaria de uma nova estrutura, mas de uma valorização, integrando fé, espiritualidade e o ecossistema existente, com os seus biomas – Mata Atlântica, Cerrado e Campos Rupestres” – explica o sacerdote.
Uma história de fé na intercessão de Nossa Senhora da Piedade
Cardeal Mota: Ilustre cidadão de Caeté, dedicou-se a defender e a preservar o Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade
Bem perto da Via do Peregrino fica o Recanto Monsenhor Domingos, onde residem as Irmãs Auxiliares de Nossa Senhora da Piedade. No local funcionava o Asilo São Luís, criado por Monsenhor Domingos Evangelista Pinheiro para acolher e promover as filhas dos escravizados libertas pela Lei do Ventre Livre, por meio dos estudos e da profissionalização. As Irmãs são verdadeiras guardiãs das tradições centenárias de toda a região.
Uma parte dessa bonita história foi escrita no coração da Irmã Inês Venâncio de Faria, a Irmã Inesinha, que, aos 78 anos, preenche tudo à sua volta com ares de juventude e de fé. No início da vida religiosa, nos idos de 1967, ainda noviça, ela chegou ao Asilo São Luís, onde se tornou professora das meninas. “Eu ficava muito preocupada porque as crianças não tinham muitas opções para se divertir, passear, exercitar seu lado lúdico, tão importante nessa fase da vida. Então eu ‘inventava moda’ – como diziam os antigos. Uma vida simples, mas divertida. Nos passeios, contemplando a natureza, víamos as capelinhas, para nós, um lugar especial”.
Irmã Inesinha conta que para agradar as crianças providenciou a limpeza no entorno da última capelinha, que fica próxima à entrada do Santuário. Elas então passaram a se reunir no local para rezar o Ofício de Nossa Senhora, entoar salmos e fazer orações pedindo a intercessão da Virgem Maria pelas pessoas que se encontravam em dificuldade. Rezávamos muito também no cruzeiro, onde tivemos muitas graças alcançadas. “Não havia um pedido que a Mãe Piedade não atendesse. E as pessoas começaram a nos pedir orações, retornando depois para agradecer”.
As capelas chamavam a atenção de muitas outras pessoas que conheciam e amavam a Serra da Piedade. A Religiosa se recorda, por exemplo, do dia em que o Cardeal Carlos Carmelo de Vasconcelos Mota saiu do Asilo São Luís para rezar e registrou o momento em uma fotografia junto à capelinha. Nascido em Caeté, Cardeal Mota primeiro arcebispo de Aparecida e primeiro presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), foi um grande defensor do Santuário da Padroeira de Minas e devoto de Nossa Senhora da Piedade.
“Foi um período de grande riqueza espiritual que me traz muita saudade. O meu sonho, nesses mais de 50 anos, é retornar àquele lugar e reviver os mesmos momentos de fé e espiritualidade” – relembra a religiosa que todos os anos sobe a Serra da Piedade, a pé, até a Ermida da Padroeira de Minas – Basílica da Piedade, para rezar junto à imagem de Nossa Senhora da Piedade, um importante exemplar do barroco mineiro, esculpida pelo mestre Aleijadinho.