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[Artigo] Cruz de Cristo: sinal messiânico – Padre Márcio Pimentel, Paróquia São Sebastião e São Vicente

A Instrução Geral ao Missal Romano, ao tratar da disposição do presbitério e, em especial, sobre o altar e sua ornamentação, pede-se que junto ao altar haja sempre uma cruz. Na última edição típica se sugere a presença do crucificado. Nas edições anteriores, fala-se apenas da cruz e isso, talvez se deva ao fato de na tradição cristã haver também variações deste símbolo, como a crux gemmata ou cruz gloriosa que é igualmente símbolo da paixão, morte e ressurreição do Senhor, ainda que não porte consigo a imagem ipsi literi do Cristo morto. O mais importante, no caso, é o fato de a cruz ser proposta como “bem visível” à toda a assembleia, de modo que ela perceba e por esta estética experimente a si mesma como partícipe da oferta do sacrifício pascal de Cristo.

São Paulo escreve em 1Cor 1,23: “anunciamos a Cristo (Messias) crucificado”. Para o Apóstolo, a História da Salvação somente pode ser compreendida e participada a partir do evento da cruz.1 De fato, se pode colher nas palavras de Cipriano, no século III, a cruz de Jesus como uma síntese da sua existência e ministério, bem como da própria vida cristã:

“A vontade de Deus é aquela que Cristo fez e ensinou. Humildade no trato, firmeza na fé, discrição nas palavras; justiça nas ações, misericórdia nas obras, retidão nos costumes; não ofender ninguém, suportar as ofensas recebidas e conservar a paz com os irmãos; amar o Senhor com todo o coração (…) permanecer junto à cruz com fortaleza e confiança quando está em jogo o seu nome e a sua honra; mostrar nas palavras a constância que professamos…: isto é querer ser herdeiro de Cristo… isto é cumprir a vontade do Pai.”2

De fato, o Ritual de Bênçãos expressa com claridade que a cruz “é símbolo de todo o Mistério Pascal”.3 A prece de bênção detalha este aspecto de compêndio pela qual possui primazia dentre as demais imagens sacras, segundo o mesmo Ritual romano:4

“Porque, chegada a hora da sua Páscoa, Nosso Senhor Jesus Cristo, sacerdote, mestre e rei, subiu voluntariamente à árvore da cruz e converteu-a em trono da sua glória, altar do seu sacrifício e cátedra da verdade. Ali, elevado sobre a terra, venceu o inimigo antigo e, vestido com a púrpura do seu sangue, atraiu a Si misericordiosamente todos os homens. Ali, de braços abertos, Vos ofereceu o sacrifício da sua vida e deu todo o poder salvador aos sacramentos da nova aliança. Ali ensinou com a sua morte o que tinha anunciado com a sua palavra: o grão de trigo, quando morre, dá fruto abundante.”

A cruz próxima ao altar não está ali para configurar-se, ela mesma, “oriente” do Culto. Isso porque no conjunto dos elementos inconográficos não pode ocupar o lugar reservado ao próprio altar. Quem preside a Eucaristia não está voltado a todo o momento para a cruz quando, em nome da assembleia celebrante, dirige a Deus a súplicas da Igreja. Na verdade, a cruz ajuda a tornar inteligível ao povo reunido o Mistério que a Eucaristia recorda sobre a Mesa do Banquete, o sacrifício de Cristo, de modo que ela seja também interpretada como ara, isto é, pedra onde a vida de Jesus é oferecida, altar. Com ela se opera um reforço simbólico na relação entre a Mesa-Altar e a Assembleia celebrante, mas não se prevê que para ela se deva dirigir a atenção de todos preponderantemente. Evidente, no entanto, que não se exclui, em alguns momentos rituais, a possibilidade de a assembleia voltar-se de modo explícito para a cruz. Mas não é ela a dominar a cena, mas sim o altar.5 É exatamente esta a compreensão mais exata da perspectiva da reforma litúrgica do Concílio Vaticano II.

 

 

 

 

 

 

Padre Márcio Pimentel é especialista em Liturgia pela PUC-SP e mestrando
em Teologia na Faculdade Jesuíta de Teologia e Filosofia (Faje / Capes)
Paróquia São Sebastião e São Vicente



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