Popularmente conhecido como mês das festas, o mês de junho é esperado e celebrado em diversas partes do Brasil. Neste mês dedicado ao Coração de Jesus comemoramos, também de modo muito especial três grandes santos que fazem parte da nossa cultura popular: Santo Antônio, São João e São Pedro. Santos ligados à cultura do interior, do homem do campo, da colheita dos frutos da terra, santos que marcam a mudança do tempo, a chegada das chuvas, do frio e até as promessas feitas a Santo Antônio o casamenteiro para encontrar um amor verdadeiro.
É tempo também das comidas típicas da terra; da canjica, dos caldos e do milho verde, tempo das danças, dos concursos de quadrilha, tempo propicio para nos recordar que somos homens e mulheres da cultura do encontro, de relação e não de fechamentos sobre si mesmos. Enfim, tempo de desvelar a memória do passado capaz de resignificar o presente. Deixar com que a luz e o calor que emanam das fogueiras adentrem os nossos olhos e revelem nossa origem, os valores transmitidos por nossos antepassados e sobretudo, despertem em nós a esperança que através destes valores simples, podemos sim, contribuir para a construção de uma sociedade melhor e mais justa.
Por isso mesmo, essas festas populares ultrapassam o âmbito da piedade popular católica.
Pertencem realmente a uma Religiosidade popular que diz respeito a todos, que fala e traz à tona realidades que constituem o nosso tecido existencial, o nosso modo de ser enquanto pertencentes a determinado povo, cultura, tradição. Lugar onde nós nos reconhecemos. Não é por acaso, que essas festas continuam ainda hoje a serem celebradas até mesmo nos grandes centros urbanos, nas grandes cidades. Muitas delas não mais geridas e organizadas pela Igreja e suas comunidades eclesiais, mas não é por isso que devem ser demonizadas ou desprezadas. Pelo contrário, somos nós, a Igreja que sempre foi criadora de cultura, que é chamada neste tempo de secularização, a aprender dessas festas a flexibilidade da acolhida do diferente. A Igreja é chamada a perceber quais os valores escondidos nestas manifestações populares, podem ser resgatados e assim como homens e mulheres que caminham na visão do ressuscitado, ajudar as pessoas a vivenciar e a elevar estes valores à sua máxima potência: aquela que nos ajuda a viver a liberdade dos filhos e filhas de Deus.
No centro de cada uma dessas manifestações religiosas está Cristo, nossa missão como Igreja, Povo de Deus é ajudar as pessoas a fazerem a passagem da Religiosidade popular muitas vezes centrada em uma postura individualista que visa somente suprir as próprias necessidades àquela de uma verdadeira Piedade popular que vai de encontro ao outro e suas necessidades, porque alicerçada em Cristo que em sua morte e ressurreição nos fez todos irmãos e filhos do Pai.
Menosprezar ou demonizar as manifestações festivas da Religiosidade popular é perder uma oportunidade ímpar de testemunhar o Evangelho da vida. No âmbito da nova evangelização, as manifestações externas de Religiosidade popular como aquelas internas à vida eclesial a dizer: a Piedade popular, são espaços privilegiados, onde a Igreja em saída é chamada a se fazer presente. Enxergar essas manifestações com o olhar do Bom Pastor que não se aproxima para julgar e condenar, mas para acolher, é também um modo de assumir a opção preferencial pelos pobres.
Grande parte das pessoas que vivem esta experiência, este modo de exprimir sua relação com Deus são pessoas simples. Neste sentido, seria equivocado optar pelos pobres deixando à margem, na periferia o seu universo simbólico religioso que os mantém conectados com os valores e cultura herdada de seus antepassados .
Que os padroeiros deste mês de junho, Santo Antônio, São João e São Pedro nos alcancem do Coração de Jesus, a graça da abertura sempre maior ao Espírito Santo que anima e conduz a Igreja.
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1 Cf. Evangelii Gaudium, 125.
Padre Mateus Lopes
Estudante de Teologia na Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma
Para aprofundamento do tema:
Francisco, Exortação Apostólica Evangelii gaudium, 122-126.
Documento de Aparecida, 258-265.
J.C. Scannone., La teología del Pueblo.