O patrimônio sacro de Minas Gerais é uma dádiva. Misterioso, muitas vezes sua grandeza se esconde nas pequenas igrejas e suas paredes de taipa. Ainda que cativante pela simplicidade de suas formas quadradas e paredes brancas, são pequenos templos, como a Igreja de Nossa Senhora do Ó, em Sabará, que se revelam grandes, quando se abrem as portas. Como todo trabalho ligado à memória e cultura, as ações do Memorial da Arquidiocese de Belo Horizonte devem ser consideradas em seu máximo. São quinze anos de preservação e conquistas. São ações contínuas e cotidianas, que sintonizam com a maneira íntima e própria da identidade de cada comunidade cristã, entendendo o sentir, a religiosidade e a experiência peculiar da devoção, na qual a fé transvaza e sublima.
Portadora de grandioso e valoroso patrimônio cultural, a preocupação com a salvaguarda e preservação dos bens culturais e memória católica sempre esteve presente nas ações e gestões da Arquidiocese de Belo Horizonte. Tal preocupação é comprovada desde 1992, com a criação do antigo Centro de Documentação e Informação da Cúria de Belo Horizonte – CEDIC/BH, sendo este, responsável por “resgatar e organizar a documentação dos Departamentos da Presidência, Chancelaria, Jurídico, Contabilidade, Pessoal e Financeiro da Mitra Arquidiocesana”.
Conforme a carta circular, a função pastoral dos arquivos eclesiásticos (1997, p.5), a Igreja avalia os arquivos eclesiásticos como “um lugar da memória das comunidades cristãs e um importante instrumento a ser utilizado na evangelização”. Além disso, de acordo com o documento base da CNBB sobre a arte sacra, no que tange aos documentos textuais, ressalta-se:
[…] os documentos escritos, muitos deles preciosos, quer pelo valor artístico, quer pelo valor histórico, devem ser reunidos em arquivos paroquiais, diocesanos ou interdiocesanos, para que sejam preservados e colocados a serviço dos estudiosos e pesquisadores. (CNBB, 1971).
Outra medida de preservação e conservação dos bens culturais sob a jurisdição da Arquidiocese de Belo Horizonte foi a criação da Comissão Arquidiocesana de Arte Sacra – CAAS. Moldada conforme as orientações da Constituição Conciliar Sacrosanctum Concilium, a CAAS foi instituída por intermédio da Portaria nº 01/1996, promulgada por Dom Serafim Fernandes, na ocasião arcebispo metropolitano. Além de orientar e supervisionar a elaboração de projetos para a construção de igrejas e capelas, a referida Comissão deveria examinar o estado de conservação e acompanhar os trabalhos de restauração dos bens da Igreja, sugerindo eventuais medidas de proteção e preservação de sua integridade, e elaborar o inventário dos monumentos históricos e artísticos da Arquidiocese. Mais tarde, as atividades, outrora exercidas pela CAAS passaram a ser executadas pelo Inventário do Patrimônio Cultural da Arquidiocese de Belo Horizonte, cujos trabalhos tiveram início a partir de 2000, desempenhados pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas.
Finalmente, em 22 de agosto de 2005, Dom Walmor Oliveira de Azevedo, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, promulgou o Decreto nº 04G/2005, que constitui o Memorial Arquidiocesano. Visando potencializar os esforços preservacionistas acerca dos bens culturais da Arquidiocese de Belo Horizonte, o Memorial nasce como uma iniciativa para reunir agentes e competências técnicas, direcionados e atuantes nas ações de gestão cultural, memória e patrimônio, agregando orientações dos órgãos de preservação como o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN e o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais – IEPHA MG. Consequentemente, foram agregados ao corpo funcional do Memorial, o antigo CEDIC, atual Arquivo Arquidiocesano, e o Inventário do Patrimônio Cultural. Além disso, foram criados o Centro de Promoção e Divulgação Religiosa e o Museu Arquidiocesano de Arte Sacra, que juntos integram e compõe as quatros unidades do Memorial Arquidiocesano.
Inaugurado em abril de 2010, com todas suas unidades em funcionamento e instalado no bairro Santa Tereza, na capital mineira, o Memorial da Arquidiocese de Belo Horizonte opera, desde então, na proteção dos bens culturais da Igreja, mantendo também assessoria permanente às paróquias e comunidades em relação à preservação, conservação, proteção e recuperação de bens patrimoniais. A partir do Decreto nº 17/2016, as ações do Memorial passaram a ser vinculadas ao Vicariato Episcopal para a Ação Missionária nas Cidades Histórico-Barrocas – Veam, tendo apoio e orientação do Bispo Auxiliar Dom Vicente de Paula Ferreira, C.Ss.R, e Padre Wellington Santos como Vigário Episcopal. Atualmente, o Memorial da Arquidiocese de Belo Horizonte trabalha ao lado das paróquias de 28 municípios do Estado de Minas Gerais, no escopo de identificação, preservação e conservação dos bens culturais de caráter material e imaterial.
Museus em Rede
Os museus e espaços museológicos são fontes de grande pesquisa e atuação profissional do Memorial. Isto é, no momento em que se comemoram os 15 anos de fundação do Memorial da Arquidiocese de Belo Horizonte iniciam-se as primeiras atividades ligadas ao projeto intitulado “Museus em Rede”, que visa o mapeamento de atividades museológicas e intercâmbio cultural entre os espaços museais da Arquidiocese de Belo Horizonte. A ideia é mapear os museus, espaços museológicos e rotas religiosas/patrimoniais para compor um diálogo arquidiocesano, fomentando a uma colaboração mútua entre os espaços de caráter museológico. Esta iniciativa é uma parceria entre a Arquidiocese de Belo Horizonte, por meio do Memorial e a CNBB, através do Pe. Luciano da Silva Roberto, Assessor do Setor Cultura da CEPEC/CNBB. Já fazem parte dessa iniciativa o Complexo Religioso de Caeté, o Santuário Nossa Senhora da Piedade e o Museu Maria Regina Mundi – MRM, em Caeté; Complexo Religioso de Santa Luzia e o Museu Arquidiocesano de Santa Luzia, em Santa Luzia; Complexo Religioso de Sabará e o Museu de Arte Sacra/Igreja de N. Sra. do Rosário, em Sabará; Complexo Religioso de Pedro Leopoldo, em Pedro Leopoldo; Museu Arquidiocesano de Arte Sacra – MAARSA e a Capela Curial São Francisco de Assis, ambos em Belo Horizonte.
15 anos de trabalho em prol ao patrimônio cultural e religioso de Minas Gerais
A mais nova atuação do Memorial é ligada, diretamente, à Capela Curial São Francisco de Assis, que compõe o complexo arquitetônico da região da Pampulha, e que desde 2016 possui o Título de Patrimônio da Humanidade pela Unesco. Passando por processos de restauração e recuperação, a Capela Curial São Francisco de Assis reabriu suas portas em outubro de 2019, adquirindo caráter museal, uma vez que visitantes de outras localidades brasileiras e de todas partes do mundo se deslocam até Belo Horizonte para aprecia-la. Contando com ações educativas para proporcionar a melhor experiência e fruição artística, além de diálogos entre a comunidade e o patrimônio cultural, o Memorial busca integrar a percepção religiosa que a Capela Curial apresenta por meio da arte e da fé.
Devido à pandemia do novo coronavírus, atualmente, as atividades presenciais estão suspensas, ao passo que se viu a necessidade de trabalhar com uma cartilha informativa, que apresentará os temas mais requisitados pelo público que frequentou a Capela Curial nesse último período. De forma virtual e gratuita, a cartilha está em desenvolvimento e chegará em breve a toda comunidade que queira saber mais sobre este patrimônio cultural.
Com inúmeros projetos em andamento, mesmo com os cuidados sanitários necessários para o combate à COVID-19, o Memorial da Arquidiocese de Belo Horizonte comemora seus 15 anos de trabalho em prol ao patrimônio cultural e religioso de Minas Gerais. O incentivo à cultura e à religião que a Arquidiocese de Belo Horizonte está empregando é prova viva que uma instituição respeitável e educativa como o Memorial Arquidiocesano realiza, cada vez mais, um papel de suma importância para a cidade. E que venham mais muitos anos de trabalho e dedicação em torno de ações patrimoniais e religiosas, para que no amalgama cultural possa crescer o interesse da comunidade mineira pelo patrimônio religioso e a arte sacra.
Rayane Soares Rosário – Museóloga/ Memorial da Arquidiocese de Belo Horizonte e Pedro Henrique Barata Carvalho – Estagiário de História/ Memorial da Arquidiocese de Belo Horizonte.
Referências
CARTA PASTORAL do Episcopado Mineiro ao clero e aos fiéis de suas dioceses sobre o patrimônio artístico. Belo Horizonte: Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais, 1926.
CNBB. Documento-base sobre arte sacra. Comunicado Mensal, n. 227, Brasília, 1971.
CONSTITUIÇÃO Conciliar Sacrosanctum Concilium sobre a Sagrada Liturgia. In: CONCÍLIO VATICANO II. 1962-1965. Disponível em: http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vati_const_19631204_sacrosanctum-conciliu m_po.html. Acessado em: 30 de julho de 2020.
MARCHISIANO, Francesco; CHENIS, Carlo. Necessidade e urgência da inventariação e catalogação do patrimônio cultural da Igreja. Cidade do Vaticano: Pontifícia Comissão para os Bens Culturais da Igreja, 1999.
PONTIFÍCIA COMISSÃO PARA OS BENS CULTURAIS DA IGREJA. Carta Circular: a função pastoral dos arquivos eclesiásticos. Editora do Vaticano. Cidade do Vaticano, 1997.
TEIXEIRA, Luiz Gonzaga; FONSECA, Mônica Eustáquio. Inventário do Patrimônio Cultural da Arquidiocese de Belo Horizonte. In: CAMPOS, Adalgisa Arantes et al. Atas do IV Congresso Internacional do Barroco Íbero-Americano. Ouro Preto: C/Arte, 2006.