A densa vegetação e as montanhas de Minas Gerais proporcionam a Caeté um clima agradável, onde ainda se respira ar puro. A presença do Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade, no Alto da Serra da Piedade, atraindo milhares de peregrinos, a sabedoria de Monsenhor Domingos Evangelista Pinheiro, fundador da Congregação das Irmãs Auxiliares de Nossa Senhora da Piedade e o povo conhecido por sua hospitalidade foram fundamentais na valorização e preservação desse território abençoado por suas belezas naturais e pela diversidade da fauna e da flora.
Caeté está situada em uma região singular do Planeta, de transição da Mata Atlântica para o Cerrado, apresentando nas partes mais altas da Serra da Piedade os Campos Rupestres. Biomas que convivem em harmonia e constituem uma raridade na natureza, proporcionando as condições propícias para o desenvolvimento de uma verdadeira farmácia verde. É o que explica o senhor Antônio Claret, natural de Caeté e farmacêutico graduado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
O Museu Pharmacia ideal, organizado pelo farmacêutico Antônio Claret e em fase de revitalização, é importante referência na história |
Hoje com 74 anos, o farmacêutico cresceu ouvindo a história da família, que desde o início do século passado ajuda a cuidar da saúde da população de Caeté: ele recorda que o tio, Joaquim Fernandes Mello, fundador da Farmácia Ideal, fez da própria casa um hospital para amparar e tratar dos doentes durante a Gripe Espanhola de 1918. Assim, ele aprendeu a amar a profissão que exerce há 50 anos. À frente da Farmácia Ideal, nome preservado desde sua inauguração, o senhor Antônio é também um talentoso historiador. Trabalha 10 horas diárias, e ainda encontrou tempo para reunir publicações científicas dos séculos 19 e 20 e objetos de trabalho usados na produção dos remédios, no precioso acervo do Museu Pharmacia Ideal.
O senhor Antônio Claret conta que sua família construiu uma duradoura amizade com os padres do Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade, entre eles, o Frei Rosário Joffily, e com o Asilo São Luís, hoje Recanto Monsenhor Domingos. O tio, Joaquim Fernandes de Mello, era grande amigo do Monsenhor Domingos e estava sempre pronto a enviar os medicamentos necessários para cuidar da saúde das meninas que estudavam na instituição. “Acredito que tenha sido o meu tio Joaquim quem partilhou os seus conhecimentos de botânica e farmácia com Monsenhor, indicando as plantas que formariam a horta medicinal do Asilo”.
Espaço de conforto para o espírito e saúde para o corpo
As religiosas da Congregaçãodas Irmãs Auxiliares de Nossa Senhora |
As religiosas da Congregação das Irmãs Auxiliares de Nossa Senhora da Piedade pretendem revitalizar e ampliar a horta criada por Monsenhor Domingos, transformando-a em um espaço terapêutico capaz de contribuir para o restabelecimento das pessoas hoje sobrecarregadas pela rotina das grandes cidades. “A ciência comprova que o ar puro, o acolhimento humano e o contato com a natureza não só ajudam na saúde psicológica e emocional, mas são determinantes para a saúde do corpo. Quantas pessoas chegam das diferentes regiões do País e até do exterior e sentem-se revigoradas no Recanto Monsenhor Domingos, ao respirar os ares de Caeté, entrar em contato com a natureza e fazer uso dos chás preparados com as ervas medicinais da região” – observa Madre Teresa Leite, que coordena os trabalhos das religiosas. O espaço terapêutico, segundo a religiosa, deverá reunir a maior diversidade possível das plantas existentes na Serra da Piedade, utilizadas pela medicina popular.
“No bioma singular dessa região onde se encontram o Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade e o Recanto Monsenhor Domingos, existe uma enormidade de espécies utilizadas ancestralmente pelo povo, a exemplo da macela, que acalma as cólicas intestinais nas crianças, o assa-peixe, para combater o cobreiro, o chá de quebra-pedra, utilizado até hoje pelas pessoas para expelir cálculos renais – pedra nos rins, a melissa, para o chá calmante. Há inúmeras outras possibilidades de benefícios para as pessoas na vegetação da região, que sequer foram estudadas” – destaca o fundador do Museu Pharmacia Ideal.
No Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade, Monsenhor Domingos se encontrou com os primeiros estudiosos da flora e da fauna brasileiras |
A biosfera da Serra da Piedade atrai o interesse de cientistas de diferentes países desde o século 19, a exemplo do botânico, naturalista e viajante francês, August de Saint’ Hilaire, que se estabeleceu por alguns dias no Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade para estudar a flora e fauna do lugar. Saint’ Hilaire esteve por três vezes no Santuário, quando se encontrou com o Monsenhor Domingos. Em comum eles tinham o interesse pela preservação da natureza. O trabalho realizado pelo pesquisador francês resultou num importante catálogo de espécies brasileiras e em livros sobre a cultura e paisagens do Brasil, até hoje revisitados por estudiosos e cientistas.
Monsenhor Domingos também recebeu, no Santuário da Piedade e no Asilo São Luís um dos mais importantes pesquisadores de sua época. Von Martius, médico, botânico e antropólogo alemão, que realizou importantes estudos na Serra da Piedade. Ele chegou ao País em 1817, junto com a comitiva da grã-duquesa austríaca Leopoldina, que viajava ao Brasil para se casar com dom Pedro I. A Flora Brasiliensis foi a obra de maior importância de Von Martius que tinha a missão de documentar e sistematizar espécies de plantas brasileiras e também sua utilização medicinal, comercial e econômica.
O que os pesquisadores talvez não tenham catalogado é a importância dos ares e da hospitalidade do povo de Caeté na recuperação da saúde da alma e do corpo. Uma dádiva dessa incomparável região situada entre a Mata Atlântica e o Cerrado brasileiro.