É desafiadora a arte de conduzir a vida de forma a bem discernir sobre juízos e equívocos. Os juízos precisam, fundamentalmente, da competência humanística e ética que rege, na racionalidade de cada indivíduo, os processos de discernimento a respeito de valores e princípios. Cultivar esta competência deve ser meta e exige irrestrita abertura ao diálogo. Para garantir êxito às decisões, os juízos devem ser orientados por nobre sentido de cidadania e pela compreensão de que a vida é precioso dom.
A experiência de quem ocupa um cargo importante conta muito, mas não é garantia de qualificado discernimento, imprescindível na tomada de decisões. A consolidação do juízo a respeito de algo exige considerar diferentes perspectivas para vencer interpretações limitadas, não raramente emolduradas por interesses egoístas, parciais. Isso para qualificar os processos de discernimento e evitar os equívocos que possam validar práticas antidemocráticas, as decisões inadequadas no âmbito judicial ou em outras instâncias que inviabilizam as almejadas viradas civilizatórias.
Existem muitos recursos naturais, técnicos e científicos que podem promover o desenvolvimento integral e a construção de uma sociedade mais justa e solidária. Mas os juízos equivocados inviabilizam os avanços possíveis. Perpetuam fracassos. Aprisionam a civilização em “atoleiros”. Reproduzem marasmos incompatíveis com o mundo contemporâneo, ansioso por respostas rápidas para seus muitos e graves problemas. Há, pois, um longo caminho a ser trilhado, envolvendo diferentes instâncias sociais, para qualificar processos de discernimento, com muito diálogo, fundamentais para a formulação de juízos mais assertivos.
É vergonhoso e gera espanto o atual cenário de atrasos, a prevalência de interesses pouco nobres, o favorecimento perverso de pequenos grupos, sedentos doentiamente por dinheiro. Situação incompatível com a trajetória cidadã, histórica, religiosa e cultural do povo brasileiro, levando à derrocada até mesmo os que se consideram privilegiados. Sobre todos, paira a ameaça de ver o mundo desabar, não deixando “pedra sobre pedra”, como disse Jesus aos que se maravilhavam, orgulhosamente, a respeito das belas pedras votivas do Templo de Jerusalém.
Superar equívocos nos processos de discernimento é uma tarefa existencial a ser assumida por todos. Reconhecer e se dedicar a esse compromisso permite encontrar duradoura alegria e o verdadeiro sentido da vida. É preciso vencer a idolatria do dinheiro, fonte de ganância sem limites, verdadeiras barragens que impedem a solidariedade e a compaixão diante do sofrimento humano. “Rejeitos” e “lamas” assim se produzem por conta de juízos equivocados, em todos os níveis, varrendo vidas e o meio ambiente.
Deve prevalecer sempre a consideração de que a verdadeira joia, a mais genuína riqueza, é a vida humana, dom maior no conjunto da Criação. Os equívocos nas escolhas fazem da sociedade - que deveria ser o lugar da solidariedade e do respeito ao outro, que é irmão - um verdadeiro inferno. O antídoto para mudar esse cenário desolador é cuidar melhor do santuário sagrado que existe no interior de cada pessoa, a consciência moral, de onde se escuta uma Lei que precisa ser obedecida, não por imposição, mas a partir da mais genuína liberdade. A Lei do amor, que indica o caminho do bem e distancia as pessoas do mal.
A injustiça, a crise econômica e tantas outras situações que geram sofrimento apontam para a necessidade de radical renovação pessoal e social. É preciso cultivar mais solidariedade, honestidade, transparência, investindo sempre mais nos processos de discernimento. Caminho desafiador, mas capaz de consolidar juízos com força para conduzir a sociedade rumo a qualificadas etapas civilizatórias. Essa tarefa cidadã é de cada um de nós.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
Ilustração: Jornal Estado de Minas