O Nascimento da Arquidiocese de Belo Horizonte

Flávia Costa Reis
memorialhistoriadorinv@arquidiocesebh.org.br

 

No ano de 2021 a Arquidiocese de Belo Horizonte celebra os 100 anos de sua criação, iniciada pelo desmembramento da Arquidiocese de Mariana em 1921 e subsequente elevação a Arcebispado no ano de 1924.

Quando ocorreu a construção da nova capital em fins do século XIX, o tema da criação de uma nova Diocese em Belo Horizonte, ainda não havia surgido, pelo menos não oficialmente documentado, sabendo-se apenas sobre boato surgido em 1909. Pode-se supor, porém, que o fato de a instalação da pedra fundamental da nova edificação da Matriz da Boa Viagem, no ano de 1911, ter contado com tantas figuras importantes, com a presença de grandes nomes da Igreja e do Governo Provincial, que vieram de várias partes de Minas Gerais e até de outros Estados, poderia significar que estava se pensando em transformá-la em sede de uma nova Diocese.

Suposições à parte, sabe-se que somente no ano de 1919, o Núncio Dom Ângelo Scapardini viria a Minas para tratar com o então Arcebispo de Mariana, Dom Silvério, sobre a constituição de uma Diocese na capital belo-horizontina. Nesse sentido, foi criada comissão especial para estabelecer a nova Diocese, da qual fariam parte os párocos da Igreja Matriz de São José, localizada no Centro da Capital, e da Matriz da Boa Viagem. Esse último, Monsenhor João Martinho, havia sido nomeado presidente da referida Comissão, que se reuniu pela primeira vez no dia 28 de setembro de 1920. Nessa mesma reunião, Monsenhor Martinho anunciou a Matriz da Boa Viagem como Catedral da Nova Diocese.

Devido à carência de recursos, porém, pouco pode ser executado antes da constituição oficial no novo bispado, como uma residência para o novo Bispo, por exemplo.  Ressalta-se que também a igreja escolhida para Catedral ainda se encontrava em obras.

Mesmo sob tais condições, em princípios de 1921, a 11 de fevereiro, por meio da Constituição Apostólica Pastoralis sollicitudo[1], é criada a Diocese de Belo Horizonte e a Matriz de Nossa Senhora da Boa Viagem é elevada à dignidade de Catedral. Em novembro do mesmo ano, foi nomeado seu primeiro Bispo, Dom Antônio dos Santos Cabral, então Bispo de Natal, desde 1917. Sua chegada à capital se deu em 30 de abril de 1922, acompanhado de grande cortejo até a Matriz de São José, que foi anunciada como Catedral provisória até que as obras da Boa Viagem tivessem finalizadas.

Segundo pesquisa realizada pela equipe do Inventário do Patrimônio Cultural (2001)[2],

A primeira residência episcopal de Belo Horizonte instalou-se em edificação unifamiliar situada à rua dos Guajajaras, entre a avenida João Pinheiro e ruas Goiás e Sergipe. Transferida para imóvel localizado à rua Rio Grande do Norte, atualmente Pensionato Santa Teresa, mudou-se novamente para a rua Paraíba, onde, por fim, segundo informações orais, o então Arcebispo de Belo Horizonte, Dom Antônio dos Santos Cabral, planejou e acompanhou a construção do Palácio Cristo Rei.

Vice-presidente do Estado de Minas Gerais, Olegário Maciel, Dom Henrique Gasparri e Dom Antônio dos Santos Cabral na escadaria do então Palácio Episcopal, em Belo Horizonte – 1924 [3]

 

Dom Antônio dos Santos Cabral, primeiro Arcebispo de Belo Horizonte, recebendo a imposição do pálio do Núncio Apostólico Dom Henrique Gasparri, 1924 [4]

Durante ainda alguns anos a Matriz de São José funcionou, portanto, como Catedral provisória da Diocese. Sua igreja, além do fato de ter maiores dimensões que a Boa Viagem, também se localizava em ponto central da capital, chegando-se mesmo a cogitar transformá-la em Sé definitiva, o que não se efetivou por falta de recursos. Mesmo ainda em obras, a Catedral de Nossa Senhora da Boa Viagem foi oficialmente inaugurada no dia 8 de dezembro de 1923, dia da Imaculada Conceição. Nesse momento, apenas metade das obras havia sido concluída.

Com a perspectiva do crescimento da capital e, consequentemente de sua importância religiosa, no dia 1º de fevereiro de 1924, ocorre a elevação de Belo Horizonte à Arcebispado, por meio da Constitutio Apostolica Ad munus Nobis ab aeterno Pastorum Principe [5], onde se lê:

[…] ao nosso venerável Irmão Antônio dos Santos Cabral, que atualmente governa a Igreja Belo-horizontina, concedemos-lhe o título, dignidade, direitos e privilégios de Arcebispo, como também lhe damos a faculdade de trazer, como outros Arcebispos, a cruz e o Pálio […] (MOURÃO , 1977, p. 8)

A imposição do Pálio a Dom Cabral pelo Núncio Apostólico Dom Henrique Gaspari ocorreria no fim do mesmo ano, em 30 de novembro, mas a sagração da Boa Viagem apenas ocorreria em 15 de agosto 1932, com o encerramento das obras de sua edificação. A data foi escolhida em comemoração ao 25º aniversário da ordenação sacerdotal de Dom Cabral, além de ser o dia da Padroeira do Arcebispado.


 

[1] Publicada em forma de Bula. CONSTITUTIO Apostolica Pastoralis sollicitudo. – Dismembrationis et erectionis dioecesis Bellohorizontinae – 1921 Febr. 11. In.: ACTA APOSTOLICAE SEDIS. Commentarium Officiale. Annus XIII. Volumen XIII. Romae: Typis Polyglottis Vaticanis, MCMXXI. P. 336. Disponível em: vatican.va/archive/aas/documents/AAS-13-1921-ocr.pdf. Acesso em dezembro de 2020.


[2] INVENTÁRIO do Patrimônio Cultural da Arquidiocese de Belo Horizonte. Capela do Palácio Arquiepiscopal Cristo Rei. Belo Horizonte, 2001.


[3] Apesar de se encontrar nas referências do site do Arquivo Público Mineiro que as fotografias anexadas são do ano de 1923, os eventos em questão ocorreram no ano de 1924, quando da imposição do Pálio a Dom Cabral, após a elevação ao título de Arquidiocese. http://www.siaapm.cultura.mg.gov.br/modules/fotografico_docs/photo.php?lid=30761


[4] Aqui ocorre o mesmo da foto anterior.http://www.siaapm.cultura.mg.gov.br/modules/fotografico_docs/photo.php?lid=30759


[5] Publicada em forma de Bula. CONSTITUTIONES Apostolicae: Ad munus Nobis ab aeterno Pastorum Principe – Bellohorizontinae. Erectionis Provinciae Ecclesiasticae –1924 Febr. 1. In.: ACTA APOSTOLICAE SEDIS. Commentarium Officiale. Annus XVI. Volumen XVI. Romae: Typis Polyglottis Vaticanis, p. 264. Disponível em: vatican.va/archive/aas/documents/AAS-16-1924-ocr.pdf Acesso em dezembro de 2020.


Referências Bibliográficas e Fontes:

ARQUIVO ARQUIDIOCESANO DE BELO HORIZONTE. Carta da Diretoria da Associação Central da Diocese de Belo Horizonte. s/d. Paróquia São José – Documentos jurídicos e patrimoniais. Sala 10. Caixa 640.

ARQUIVO ARQUIDIOCESANO DE BELO HORIZONTE. Dom Antônio dos Santos Cabral. Fotografias. Caixa 15. Sala 13.

ARQUIVO PAROQUIAL. Livro do Tombo Matriz de Nossa Senhora da Boa Viagem. 1922 – 1955.

ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO. Embaixador do Papa Dom Henrique Gasparri impondo o Palio ao Exmo. Dom Antonio Dos Santos Cabral, 1º Arcebispo de B. Horizonte (MG). Fotografia. Acervo Iconográfico. Autoria de Gines Gea Ribera. Belo Horizonte, 1923. Disponível em: http://www.siaapm.cultura.mg.gov.br/modules/fotografico_docs/photo.php?lid=30759. Acesso em: 8 jan. 2021

ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO. Visita do Vice-presidente do Estado de Minas Gerais Olegário Maciel ao Embaixador do Papa Dom Henrique Gasparri no Palácio Arquiepiscopal em Belo Horizonte (MG). Fotografia. Acervo Iconográfico. Autoria de Gines Gea Ribera. Belo Horizonte, 1923. Disponível em: http://www.siaapm.cultura.mg.gov.br/modules/fotografico_docs/photo.php?lid=30761. Acesso em: 8 jan. 2021

BARRETO, Abílio. Belo Horizonte. Memória histórica e descritiva. História Antiga. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1996.

CONSTITUTIO Apostolica Pastoralis sollicitudo – Dismembrationis et erectionis dioecesis Bellohorizontinae – 1921 Febr. 11. In.: ACTA APOSTOLICAE SEDIS. Commentarium Officiale. Annus XIII. Volumen XIII. Romae: Typis Polyglottis Vaticanis, MCMXXI. P. 336. Disponível em: <vatican.va/archive/aas/documents/AAS-13-1921-ocr.pdf. > Acesso em dezembro de 2020.

CONSTITUTIONES Apostolicae: Ad munus – Bellohorizontinae. Erectionis Provinciae Ecclesiasticae –1924 Febr. 1. In.: ACTA APOSTOLICAE SEDIS. Commentarium Officiale. Annus XVI. Volumen XVI. Romae: Typis Polyglottis Vaticanis, p. 264. Disponível em: <vatican.va/archive/aas/documents/AAS-16-1924-ocr.pdf > Acesso em dezembro de 2020.

DOM ANTÔNIO DOS SANTOS CABRAL. FGV CPDOC. Texto biográfico.Religioso; arceb. Belo Horizonte 1922-1956. Disponível em: <http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/cabral-antonio-dos-santos> Acesso em janeiro de 2020.

DOM CABRAL e suas obras. Belo Horizonte: Imprensa Oficial do Estado, 1943.

INVENTÁRIO do Patrimônio Cultural da Arquidiocese de Belo Horizonte. Capela do Palácio Arquiepiscopal Cristo Rei. Belo Horizonte, 2001.

 

LEITE, Boaventura João Batista (Padre C.S.S.R). São Jose 90 anos. Belo Horizonte: Expressa Artes Gráficas, 1990.

LEITE, Pe. João B. Boaventura (C. Ss. R.). Igreja de São José – BH. 2ª fundação. Redentoristas no Leste Brasileiro. Vol. III.

MOURÃO, Paulo Krüger Correa. A Catedral de Nossa Senhora da Boa Viagem de Belo Horizonte (dados históricos por ocasião do quadragésimo aniversário da exposição e Adoração Perpétua do Santíssimo Sacramento). Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1977.

MOURÃO, Paulo Krüger Corrêa. História de Belo Horizonte de 1897 a 1930. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1970.