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VISITANDO O JARDIM DE DENTRO

 

Há dentro de cada pessoa um jardim, um espaço cheio de pétalas de silêncio, com flores sagradas e ramos de serenidade, paisagens de quietude e de paz, uma área nobre isenta de perturbação, com troncos de fortaleza, cujas raízes estão no Criador

Apesar de tudo, vem aí a Primavera!

Assim nosso poeta Carlos Drummond de Andrade saudou a primavera de 1981, num texto publicado no JB de 01 de setembro.

Quando ela chega e a boa nova anda nos campos, começamos a sonhar juntos e a inventar canções que trazem sol, embora nem sempre aprendemos a lição que já sabemos de cor…

Eis a sutil sugestão do poeta: Se na primavera não houver jardim por perto, visitemos o jardim de dentro, jardim que nem sempre visitamos!

Que sensibilidade – própria do olhar que só os poetas têm! Drummond alerta para uma lição sabida de cor, mas esquecida, neste tempo de esperança!

Ele foi ao ponto, deixou-nos uma lição que só nos resta aprender – na primavera também visitar o jardim de dentro! Santa Teresa d’Avila chamou-o de Castelo Interior!

Segundo esta carmelita singular, é neste castelo de dentro que deveríamos sempre morar, pois neste jardim de dentro vive Deus. E para ela, Só Deus basta!

De fato, há dentro de cada pessoa um jardim, um espaço cheio de pétalas de silêncio, com flores sagradas e ramos de serenidade, paisagens de quietude e de paz, uma área nobre isenta de perturbação, com troncos de fortaleza, cujas raízes estão no Criador!

Neste jardim de dentro tudo floresce, pois é espaço sagrado, unicamente habitado por Deus!

Neste espaço não cabem pessoas, coisas, pensamentos, reflexões, preocupações, paixões, temores, receios, ressentimentos, mágoas, isolamento – cabe apenas Deus!

Este espaço de quietude, o jardim de dentro, é o seu sacrário pessoal!

Muitos têm dificuldade de experimentá-lo e senti-lo, sobretudo no nosso tempo, tempo de correria e de falta de tempo para silenciar, calar, repousar, ouvir, rezar, meditar, sentir!

Hoje, há muita gente fechada fora de casa, incapaz de entrar, prisioneira da exterioridade, vivendo em castelo exterior, em jardins de fora!

Muitos têm medo de olhar para dentro de si, receio de entrar em contato com esta região nobre para fazer uma profunda experiência de silêncio e abandono, encontrar a Deus e se entreter tão somente com Ele…

E por que? Receiam entrar em contato com o passado, para não reviver memórias de angústias, perdas, mágoas, fracassos, erros, desenganos, frustrações, solidão…

No nosso tempo – tempo de jardins de fora – o homem sabe o que há em outros planetas, mas ignora o que há no seu jardim de dentro e do que mais precisa o seu coração!

Vivemos numa cultura da exterioridade, justamente quando o homem tem mais necessidade de interioridade, a fim de encontrar com o Absoluto que vive dentro de si e dá sentido à sua vida!

Como visitar o jardim de dentro? Santo Ambrósio disse que o convite de Jesus a entrar na própria casa e fechar as portas do quarto para rezar (Mt 6,1-4), não se refere ao quarto cercado de paredes; é também o quarto que está em cada um de nós – o nosso jardim de dentro!

Foi o que descobriu Santo Agostinho, depois de tanto andar nos jardins de fora: Tu estavas dentro de mim e eu fora de Ti, e Te procurava nessas formas de beleza que são tuas criaturas (Confissões – 10,27).
Que bela confissão: Santo Agostinho procurando Deus nos jardins de fora, e Deus aguardando por ele no seu jardim de dentro – Tu estavas dentro de mim e eu fora de Ti!

Não rezemos muito, mas, sempre!

A oração ajuda-nos a entrar no jardim de dentro, a ficar no Castelo pessoal e interior, para assim encontrar o Senhor da vida e ficar sob o seu olhar!

Ela, a oração, é essencial, não apenas para entrar no jardim, mas, também, para dentro dele permanecer descobrindo a face do Senhor!

 

Dom Abade Felipe da Silva
Mosteiro de São Bento, Rio de Janeiro (RJ)

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