Todos temos lugares secretos. No nosso interior moram geografias onde (quase) ninguém entra. Aí podemos guardar o melhor e o pior de nós. Viajamos por lá, tantas vezes, e esses lugares podem trazer-nos sorrisos fecundos e genuínos ou lágrimas infinitas de dor.
Em alguns lugares desse interior, corremos a sete pés para fugir deles. Passamos a correr com medo das memórias que nos trazem.
A memória é um sítio em que os acontecimentos passados e presentes ganham mais vida, potenciando ou boicotando o futuro.
As feridas da vida podem transformar-se em locais em que paramos muitas vezes para as lamber e não para as curar. Olhar para elas com amor e aceitação é parte do processo de cura. Olhar para elas sem procurar remédio que sane pode trazer-nos prejuízos. Caminhamos, como quem carrega constantemente um saco de lixo, não querendo libertar-se dele.
Cuidar das feridas, se querer tempo e acompanhamento de quem nos possa acolher com toda a nossa verdade e inteireza, requer também coragem. Precisamos de escavar as profundezas do nosso ser, de retirar o pus para não alastrar infecções.
Somos seres que carregamos uma história, pessoas e lembranças. Odores e sabores. Tudo isto nos pode fazer avançar ainda mais ou fazer-nos parar. Paralisar. Parar até que é bom. Paralisar não é. Parar para cuidar, para olhar com ternura e acolhimento. Para integrar.
Somos muitas vezes como as estradas que ao precisarem de manutenção apenas se lhes coloca outra camada de alcatrão por cima, sem fazer um tratamento profundo. Demorado. E ficamos sem saber muito bem como viajar dentro de nós.
Que não nos chegue ver-nos por fora!
O nosso interior é a nossa morada. É este que, em verdade, precisa de estar cuidado e de perene atenção.