Ainda me lembro da menina da série “Hoje é dia de Maria” cantando: “Constância, meu bem, constância. Constante sempre serei. Constante até a morte. Constante eu morrerei!”. O que também me faz lembrar os bois no arado, firmes, contínuos, obstinados, e do conceito físico de movimento retilíneo uniforme. Essas ideias todas me vêm à mente na palavra paciência.
Parece que hoje em dia essa virtude não tem sido muito apreciada. Talvez nem tanto no passado, embora vivida. Tudo bem que muitas vezes ela foi confundida com subserviência, essa coisa que nos leva a suportar até mesmo o indevido. A paciência não. Prima da esperança, ela guarda algo de paz, do não deixar-se abalar por contrariedades.
Os mais antigos costumam aconselhar a ter paciência. Parece que a experiência atesta que quase nada é constante. Ou melhor, que a grande constância da vida é a mudança e, por isso, é preciso ter paciência com as demoras e as adversidades. Cedo ou tarde as coisas mudam. Assim a paciência era algo que se recomendava mais antigamente do que hoje, em que a máxima repetida à exaustão é de que “ninguém é obrigado a nada”. E ainda se cita a Constituição Federal onde se diz: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.
A insistência na ideia de não ser obrigado gera duas posturas. A primeira é de boa autoestima e afirmação de si. Diante de algo que humilha ou degrada é importante se afirmar e romper com isso que não nos gera mais vida. Entretanto, uma segunda postura é a da incapacidade de sofrer, o que não é bom. Quem não sabe suportar incômodos e inconvenientes torna-se alguém mimado, incapaz de enfrentar sozinho a vida e vai ser infeliz porque as coisas não funcionam sempre como queremos.
Quantos, para ter ascensão social, não precisam ter paciência e suportar alguns bons anos dividindo o tempo entre trabalho e estudo, dormindo não o tanto que gostariam, muitas vezes se alimentando mal e enfrentando transporte público e trânsito caótico? Há de se esperar – lutando, mas há de se esperar. E aqui é que entra a paciência. As coisas demoram, são cansativas, dão errado. A paciência leva a erguer-se e a insistir constante.
Há coisas que se deve abandonar sim, por isso a paciência não é subserviência e tem hora que ela acaba. Contudo, ela leva a olhar os distintos cenários e a perceber as possibilidades de mudança. Sem paciência, o agricultor não colhe os frutos. Se ele tirar todo tempo a semente da terra para ver se já brotou, o grão não crescerá.
De fato, ninguém é obrigado a nada, mas a paciência permite que se chegue a novas realidades. A paciência com o aluno que tem dificuldade de aprender leva o professor a ser testemunha do seu sucesso quando formado. A paciência da mãe com o temperamento do filho pode gerar o adulto responsável. A paciência com o colega chato do trabalho leva a não piorar as relações no ambiente laboral e a ter a firmeza devida na hora de lhe corrigir. A paciência na crise financeira ajuda a ter foco e determinação na busca de emprego e prudência na administração do dinheiro. A paciência sabe a hora certa.
Em um de seus poemas, Santa Teresa de Ávila dizia: “Nada te perturbe, nada te espante. Tudo passa. Só Deus permanece. A paciência tudo alcança”. Agir no calor das emoções, sem temperar devidamente o que se sente, pode culminar em maus resultados. A paciência é o cadinho onde o tempo burila os sentimentos para se tornar o ouro purificado da ação acertada. Quando a paciência acaba e é hora de mudar, restam a temperânça e a prudência. Por isso, respeite seus ritmos. Mantenha a calma. Tenha paciência. Aguarde a hora certa. Mas saiba, sobretudo, com o que ser paciente.
Gilmar Pereira
Mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, graduado em Filosofia pelo CES-JF e em Teologia pela FAJE.