Jornal Estado de Minas destaca os 20 anos de serviços do arcebispo dom Walmor na Arquidiocese de BH
O jornal Estado de Minas, edição do dia 26 de março de 2024, publicou entrevista especial com dom Walmor Oliveira de Azevedo, rememorando as duas décadas de dedicação do Arcebispo à Arquidiocese de Belo Horizonte. Com destaque na capa do jornal, a entrevista foi produzida pelo jornalista Gustavo Werneck que, logo na introdução do texto, de modo destacado, afirmou: “Dom Walmor completa hoje 20 anos à frente da Arquidiocese de Belo Horizonte, em uma trajetória marcada pela evangelização e atenção aos mais pobres”.
A seguir, a entrevista completa com dom Walmor, em que o Arcebispo reflete sobre o seu ministério na Arquidiocese de Belo Horizonte.
Qual a avaliação do senhor sobre os 20 anos à frente da Arquidiocese de Belo Horizonte?
Muitas avaliações são possíveis nestas duas décadas de tantos acontecimentos no caminho de nossa amada Arquidiocese de Belo Horizonte. Ao olhar para o meu ministério, sempre busquei ser o primeiro a estar a serviço do povo de Deus na Capital Mineira e em sua região metropolitana. Por isso, falo com muita alegria no coração: entrego a minha vida em tudo que faço para a Igreja, para os fiéis, pois sei que a fé cristã, autenticamente vivida, pode mudar o mundo para melhor. Não são as ideologias, não é nada que possa nos dividir: a fé cristã bem vivida, com o seu compromisso irrenunciável de dedicar amor ao próximo, é que pode dar rumo novo ao mundo. Sou um semeador da Palavra de Deus na Arquidiocese de Belo Horizonte, buscando contribuir para que outras pessoas possam se unir a essa semeadura, pois, conforme nos lembra Jesus, no Evangelho segundo São Mateus, “a colheita é grande, mas os trabalhadores são poucos”.
Há algo que o senhor faria diferente?
Nada faria de modo diferente, pois agimos sempre dentro dos nossos limites humanos, mas permanentemente abertos à ação amorosa do Espírito Santo de Deus. O caminho trilhado nestas duas décadas teve percalços, indicando que outras rotas poderiam ter sido tomadas. Mas as dificuldades levam a aprendizados, à correção de rumos. Com humildade, acolho atentamente as muitas indicações dos conselhos de nossa amada Arquidiocese, antes de decisões importantes. Tudo vem sendo feito a partir do diálogo que nos amadurece, nos fortalece, ampliando horizontes de compreensão. Essa dimensão sinodal – todos juntos, protagonistas – que o Santo Padre, o Papa Francisco, quer ver ainda mais consolidada na Igreja, é vivida na Arquidiocese de Belo Horizonte. E o Espírito Santo se revela mais fortemente onde dois ou mais se unem para juntos realizarem a obra iniciada por Jesus.
O senhor começou uma grande obra, e está perto de terminá-la, que é a construção da Catedral Cristo Rei. Por que tanto empenho na edificação desse templo?
Há uma dinâmica que vem me orientando desde o início do meu ministério da Arquidiocese de Belo Horizonte: conhecer sempre mais e encantar-se com a história da Arquidiocese, enquanto se contempla novo horizonte. Na Igreja é assim: a tradição é um tesouro que traz lições para o presente e aponta caminhos para o futuro. O plano de edificar a Catedral Cristo Rei está na origem da Arquidiocese, uma história centenária. Quando cheguei, muitos me perguntaram sobre a possibilidade de retomar o projeto. Ao conhecê-lo, pude perceber que, atualizá-lo, considerando as necessidades deste terceiro milênio, possibilitaria à Igreja Particular de Belo Horizonte ser ainda mais servidora, com a ampliação de muitos trabalhos. Por isso, antes de iniciar a construção da Catedral Cristo Rei, vivemos um tempo de muita escuta, de discernimentos, até alcançarmos uma nova concepção de Catedral. Não se trata simplesmente de um templo. A Catedral Cristo Rei congrega e irradia muitos serviços nos campos da ação solidária, da evangelização, da educação, da comunicação, da promoção da cultura e da arte.
Qual a importância da catedral para os mineiros?
Certa vez ouvi de Oscar Niemeyer que a Catedral Cristo Rei é uma obra completa e tem tudo para ser um dos lugares mais visitados de Minas Gerais. Pela beleza arquitetônica da Catedral, por seus muitos serviços, partilho dessa compreensão de que será uma referência para peregrinos, de Minas Gerais e de outros lugares do mundo. Deus se revela ao ser humano de muitas formas e expressa-se também pela arte, que encanta, inspira conversão e abertura ao transcendente.
Outra frente de trabalho está na Serra da Piedade, local visitado anualmente por cerca de 500 mil pessoas. O que mais precisa ser feito no âmbito da Arquidiocese de Belo Horizonte?
O Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade – Padroeira de Minas Gerais é singular por muitos aspectos. Evangeliza ao encantar por sua magnífica simplicidade e singeleza, em um conjunto arquitetônico, histórico, cultural, paisagístico que está no centro e no ponto mais alto de um território marcado pela exuberância da natureza. A Arquidiocese de Belo Horizonte é a primeira a defender este território e seu conjunto arquitetônico, pedindo a cada pessoa, especialmente às autoridades, que também abracem essa nobre missão. O Santuário, com mais de 250 anos de história, é herança do povo mineiro. Muitos projetos precisam avançar no processo de revitalização do Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade, iniciado em 2010. Aproxima-se o momento em que iremos retomar as obras da Basílica Estadual das Romarias, igreja que começou a ser construída na década de 1970, mas não foi concluída. A Basílica Estadual das Romarias, por mais de 50 anos, recebe, principalmente, grandes grupos de peregrinos. Sua conclusão e revitalização representam importante investimento na acolhida aos visitantes.
O senhor é da Bahia, mas tem muito do espírito mineiro. Quando começou essa conexão?
A cidade em que nasci, Cocos, no sudoeste da Bahia, está em região que faz fronteira com Minas Gerais. Ali as culturas se entrelaçam, favorecendo a criação de vínculos. Depois, pude aprender mais sobre a mineiridade quando iniciei meus estudos no Seminário Arquidiocesano Santo Antônio, em Juiz de Fora. Uma realidade diferente, mais urbana. Ainda em Juiz de Fora, depois de ter sido ordenado padre, pude servir muitas comunidades de fé, de diferentes regiões, que expressam, de modo, diverso, a mineiridade. Até que em 1998, São João Paulo II nomeou-me bispo auxiliar da Arquidiocese de Salvador, quando conheci outra realidade de meu Estado. Cocos fica a mais de 800 km de Salvador, que é uma grande capital, por onde passam cidadãos de todo o mundo. Pude, assim, reencontrar as minhas raízes e, ao mesmo tempo, aprender mais sobre a multiplicidade de culturas que formam o tecido social de uma metrópole. Até que em 2004, com a nomeação para arcebispo de Belo Horizonte, matriculei-me e nova escola. A Capital de Minas Gerais e as cidades de sua região metropolitana guardam a síntese do Estado. Aqui somos chamados a evangelizar em territórios urbanos e rurais, condomínios, vilas e favelas, encontrando pessoas diferentes. Na convivialidade, consolidei um coração genuinamente baiano e autenticamente mineiro.
Nesses últimos 20 anos, o senhor foi presidente da CNBB, teve problemas de saúde, passou, como todos, pelo período da pandemia, e continua seu trabalho pastoral. De onde vem essa força?
Vem da fé, que é dom de Deus. Então podemos dizer que a força vem de Deus. Todos esses desafios e tantos outros constituem oportunidade para testemunharmos a fé, não nos deixando abater. Tantas guerras, tantas formas de indiferença, a primazia de uma lógica determinada pelo dinheiro e muitos outros sinais fazem-nos chegar a uma triste constatação: o mundo está caminhando na contramão do Evangelho. E para aqueles que dedicam a vida ao anúncio da Palavra de Deus, às lições de Jesus Cristo, essa realidade é ainda mais desafiadora. Não são poucos os que buscam menosprezar a força da fé, atacar a Igreja, seus ministros. Também não são poucos os que buscam desmerecer valores irradiados do Evangelho – no mundo contemporâneo, há quem considere normal querer passar por cima do semelhante para atingir certas metas. São normalizados ainda os revides.
Qual a mensagem aos mineiros na celebração desses 20 anos como bispo metropolitano de BH?
Servir a Arquidiocese de Belo Horizonte, por duas décadas, é uma especial alegria. Missão exigente e bela, com frutos possíveis graças à participação de muitas pessoas e, principalmente, pela força que vem de Deus. Estar a serviço do semelhante é dom, confere sentido ao viver, revestindo-o de uma alegria duradoura. Sou grato a cada lugar onde pude servir. Uma reverência especial à amada Arquidiocese de Belo Horizonte, onde tenho a oportunidade de ser o primeiro a estar a serviço de cada pessoa que procura aproximar-se do amor de Deus.
E os planos para o futuro?
Na gestão pastoral e administrativa da Arquidiocese de Belo Horizonte, naturalmente, existem muitos planos e metas, incontáveis, conduzidos por uma equipe competente de colaboradores, de evangelizadores. Para o meu ministério, continuo de coração aberto ao que pede a Igreja, na fidelidade ao Papa Francisco, sucessor do apóstolo Pedro. Sei que o Espírito Santo tudo conduz e, em minhas orações, peço sempre para agir conforme a vontade de Deus.
Há algum momento que o senhor considera como o mais importante?
Cada momento nestas duas décadas guarda a sua importância e renderia muitas histórias. Foram dados passos importantes no âmbito da gestão, com o início e acelerado avanço de processos de digitalização e prestação de contas. Ainda neste contexto de crescente digitalização, com o surgimento de novas linguagens, avançamos muito no campo da comunicação, intensificando ainda mais o nosso diálogo com toda a sociedade. Buscamos sempre cultivar proximidade, amizade e espírito colaborativo com as demais arquidioceses e dioceses de Minas Gerais – pude exercer a presidência do Regional Leste 2 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), de 2007 a 2011. Investimos na formação de padres, religiosos e religiosas, de evangelizadores leigos, com a construção do Convivium Emaús e consolidação do Instituto de Filosofia e Teologia Dom João Resende Costa no coração da PUC Minas – campus Coração Eucarístico. Ainda sobre a PUC, é preciso destacar o incentivo ao estudo e pesquisa dedicados à evangelização, com especiais frutos, a exemplo do Centro de Geoprocessamento de Informações e Pesquisas Pastorais e Religiosas (Cegipar), que acompanha cientificamente a expansão de nossas comunidades de fé, nos muitos territórios. A educação à luz do Evangelho, a partir da rede de ensino do nosso Colégio Santa Maria Minas, se expandiu para vilas e favelas, com a criação das unidades sociais nesses territórios. São cinco unidades que oferecem bolsa de estudo integral para crianças e adolescentes de famílias pobres, seguindo o mesmo padrão de ensino que consolidou o Colégio Santa Maria Minas entre as principais escolas do Estado. É sempre importante destacar que as instituições de ensino da Arquidiocese de Belo Horizonte, embora façam parte da rede particular, não objetivam o lucro. Somente no ano passado, a PUC Minas contemplou 26.496 estudantes com bolsa de estudo. Já o Colégio Santa Maria Minas, em 2023, dedicou 2.304 bolsas de estudo a alunos de famílias pobres.
Tive ainda a especial alegria de implantar o diaconato permanente na Arquidiocese de Belo Horizonte, importante força evangelizadora, formada por homens consagrados ao anúncio do Evangelho e suas esposas. Gostaria de destacar também a bênção de duas abadessas no Mosteiro Nossa Senhora das Graças, das irmãs beneditinas, simbolizando a minha dedicação às muitas famílias religiosas que evangelizam na Arquidiocese de Belo Horizonte.
A entrevista também foi publicada na versão digital do jornal Estado de Minas. Clique aqui para ver.